quinta-feira, 20 de dezembro de 2012

que ele me roubou

O que fazer com esse coração estancado
dele nada mais sai e não adianta forçar
nada mais entra tampouco
vida nenhuma, nem um comando
ele cumpre a função calado
frouxo, resignado
esse coração fajuto de nada mais serve
manda trocar porque esse eu não quero
peçam a troca imediata
troquem por outro órgão
pode ser musical, desses de igreja barroca
não, não, troquem por um pianinho
bem simples, não precisa de muitas notas
troco por qualquer coisa na verdade
ou não, joga fora logo
quem há de querer esse miolo de pão amanhecido
ele já foi bom um dia, acredite
ele já me convenceu que era um coração
eu acreditei, até fiz ele funcionar
acho que ele não gostou da ideia
joga num lixo que não recicle
se reciclar ele pode virar um imã de geladeira
ou um ratinho de dar corda
eu prefiro ver meu coração despedaçado, enterrado
eu prefiro que ele exploda, que ele se afogue
uma morte morrida ao coração
uma morte doída, que faça sair sangue
nem que seja um sangue preto, seco
nem que seja o sangue que ele me roubou a vida toda.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2012

mundo a, mundo b

De repente comecei a pertencer a um mundo que não é o meu.
De repente me dei conta e quis voltar ao meu mundo.
De repente eu já não sabia mais o caminho de volta,
de repente eu já não sabia mais qual era o meu mundo.

O que fazer com aquela vida

Quando ela se sentia linda eles ainda não se conheciam. Depois, quando foram apresentados, tudo já estava diferente. Ela já não sabia mais o que queria direito. Já não tinha muito rumo. Foi tudo muito sem querer e quando ela se deu conta, já estava deitada na grama, olhando para o céu e pensando no quanto estava perdida. Por algum tempo ela chegou a achar que ele estava a guiando para algum lugar, mas depois essa sensação passou e ela acordava todos os dias sem saber o que fazer com aquela vida. Ele nunca a entendeu. Alguma coisa nela o deixava encantado, alguma coisa inexplicável. Ela ficava lisonjeada, gostava do carinho. Mas se perdia mais e mais. Ela nunca mais se lembrou como era a sensação de se sentir linda.

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Coincidência?

This photograph is my proof de que nada nessa vida é por acaso. Look, see for yourself: I love you.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Fake Plastic Life

She bought it at the highway. There were two people selling it on the corner of the highway. "How much" she asked, and they said it was so cheap she could take it for free, so she did. Don't ever ask her if she regrets having bought that life, because she died a hundred times trying to get rid of it.

Abyss

O abismo era pequeno demais para aguentar o peso da vida.
Eu só percebi o fim quando eu acordei no meio da noite e vi que você estava ali, mas era como se não estivesse.

domingo, 2 de dezembro de 2012


corte na barriga

Eu cortei a barriga, não sei onde e nem quando, mas me deu uma tristeza imensa em pensar que esse machucado vai cicatrizar antes de você me perguntar onde foi que eu cortei. 

fim de festa

Quando o amor deles era recém-nascido existia um sofrimento tão doce. Um sofrimento quase infantil. Eles não sabiam o quanto deviam se falar durante a semana e às vezes ficavam mudos, os dois. Inseguros e receosos. Um não sabia do outro, não sabia se era hora de ligar para o outro, se o outro iria se incomodar. Ah, que coisa, é normal esse negócio? É normal que eu sofra assim? É normal sofrer de silêncio? O momento do encontro era mais do que uma alegria, um prazer, era também um alívio. Um doce alívio. Tantos suspiros, surpresas, suspeitas. O amor foi amadurecendo bem devagar. E ele resolveu pôr pra fora o desespero da distância. Ou foi ela que o fez? Algum dos dois não aguentou mais. Os dois não aguentaram. Eles concordaram que aquele silêncio era doloroso, que devia acabar, que eles não precisavam sofrer com tanto amor de sobra. Foi difícil no começo e às vezes a distância voltava. Voltava o silêncio, voltava o vazio. E um sofria de um lado, o outro sofria do outro. Foi aos poucos que o vazio foi embora. E então, certo sábado à tarde ela acordou na cama dela, a pequena cama dela, e olhou o dia. Um sol lindo, um dia todo à toa, todo azul. Mas o amor não vinha, o amor não veio, o amor havia ido. Ela ficou sentada na beirada da cama, sentindo aquele sofrimento já não tão doce do início do amor. O mesmo sofrimento tão infantil, da falta de intimidade, da falta de dia-a-dia, de começo de amor. Ela sentiu o vazio e um medo. Um medo daquele ser um vazio de fim de festa.

Frase de filme

A gente mal se conhecia. Não que a gente se conheça tão bem hoje em dia, mas nos conhecemos melhor. Naquela noite a gente mal se conhecia. Ele encontrou uma posição confortável e quando o filme entrou na parte em que o protagonista decide largar tudo e ir embora, ele dormiu. Era um filme lindo. Eu fiquei me questionando se ele estava achando o filme chato, qual era o problema, por que ele dormia. Só muito mais tarde eu descobri que ele aprendeu a dormir em filmes desde criança e não importava se fosse bom ou ruim, filmes eram feitos para dormir - na cabeça dele. O garoto do filme, desapegado do mundo, levou quase nada e foi explorar um pedaço do mundo, o pedaço que ele conseguiu alcançar. Foi uma viagem maravilhosa. E quando eu comecei a aprender alguma coisa, quando eu comecei a sentir uma vontade imensa de chorar abraçada nele, não pude. Ele dormia profundo. É no final do filme que a frase aparece: Happiness in only real when shared. Chorei sozinha.

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Quase afogado

Antigamente você ficaria preocupado, você viria até aqui (com ou sem chocolatinho), você me diria coisas doces, você insistiria no meu sorriso. Antigamente, talvez um outro você, lutaria como se isso fosse uma batalha. Como se eu fosse um pequeno diamante raro, como se eu fosse muito mais do que eu sou. Antigamente, a sua voz me acalmaria. Você me acalmaria, você me faria feliz. Antigamente, não mais que antigamente, o seu amor resgataria o meu amor, esse quase afogado amor.

Mudar

De repente a vontade passou
- e eu não quis mais fugir.
Fugir não.
Eu só quis mudar de rumo.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Estrofe um

Posso escrever uma música pra você? Se você disser que não vai ser pior, porque eu já escrevi. Mas não se preocupe ela só tem uma estrofe, e eu cantei em silêncio.
Hoje eu me senti linda, mas quando dei por mim, já estava roendo unha de novo. 

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Um remédio com gosto de mim

Tomei um remédio, mas foi ele que me tomou.
Um remédio com gosto de mim.
O dia inteiro o remédio ficou preso na garganta,
me lembrando o gosto da doença.
A doença que o remédio não cura.
Eu tomei um remédio para a doença de mim,
um remédio com gosto de doença.

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

sim eu quero

Eu só fui para aquela praia duas vezes na vida, mas podia imaginar exatamente onde ele estava sentado. Podia sentir o cheiro de mar e ouvir o barulho da praia quase vazia. Eu só fui para aquela praia duas vezes, mas sabia a quantidade de coisas secretas que haviam lá, escondidas em cada beco. Ele conhecia tudo. E eu fiquei sentada na janela do quarto, olhando para o mesmo céu que ele, pensando em coisas que só ele me faz pensar. Se você quiser eu te levo, ele me falou ao telefone. Mas a noite entrou no meu quarto e eu dormi antes de dizer sim eu quero.
Eu te amo, mas estou cansada
eu te amo, mas não dormi bem
eu te amo, mas não te entendo
eu te amo, mas tenho preguiça
eu te amo, mas estou com olheiras
eu te amo, mas você é tão diferente
eu te amo, mas você não fala nada
eu te amo, mas não te encontro
eu te amo, mas preciso de um cigarro
eu te amo, mas quero ficar em silêncio um pouquinho. Só um pouquinho, só até o dia amanhecer, só até a dor passar, só até eu nascer de novo.

È chiuso

A gente sempre chegava quando todo mundo estava indo embora. Era engraçado. "Encerramos o café da manhã, mas vocês ainda podem pedir pão de queijo direto no balcão." Ufa, conseguimos pelo menos que eles sirvam o nosso pão de queijo. Mas era assim no almoço e no jantar também. Eu às vezes ficava decepcionada com a nossa falta de cuidado com os horários estabelecidos das coisas. No primeiro dia de aula o professor já estava na metade da explicação quando a gente chegou. E nas outras aulas foi a mesma coisa. O pior é que gente se esforçava, juro. Subimos por um caminho longo, chovia fininho, fazia frio. Era nossa viagem de lua-de-mel, sem que a gente fosse casar nem nada. Nós dois estávamos com fome e queríamos ir no restaurante que o cara do lobby nos indicou. Cansados e famintos vimos as últimas pessoas saírem de lá, um bando de jovens locais. "È chiuso." "ma per favore, signora" "vá bene, venire presto!" Eu demorei pra perceber o que era. Eu demorei pra perceber que a gente não estava atrasado nem adiantado. O nosso negócio é que a gente sempre teve o nosso próprio timing. Os nossos horários eram só nossos e eram diferentes do resto do mundo, sempre foi assim.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Uma razão

O verão chegou um pouco antes do que deveria. Eu ainda não estava pronta para ele. Não tinha conseguido parar de fumar, não tinha conseguido emagrecer e nem deixar as unhas crescerem. O verão foi muito ingrato, quanto eu estava toda em forma ele não veio, me esnobou. Mas tudo bem, eu decidi que não ia sair de casa. É claro que a misantropia tem um limite e se não cuidar acaba virando uma depressão das brabas. Mas eu não fiquei com depressão, tenho aversão a essa palavra e a todo mundo que chega a esse ponto. Então me mexi antes de acontecer algo do tipo. Liguei para a Lola, fomos tomar um café. É claro que ela falou que eu estava péssima, que eu tinha que voltar a ter um foco, que uma hora a grana dos pais para de chegar, que eu tinha que voltar a escrever. Voltar a escrever? Ela foi boazinha, escrever obituários no jornal não é escrever. Eu amava a morte, eu amava descobrir que o homem que inventou a tampa do iogurte tinha morrido. Mas aquilo que eu fazia não era escrever, não era um emprego decente. Era totalmente substituível, qualquer estagiário podia fazer no meu lugar. Enfim, Lola, eu tô bem, não te chamei aqui para ouvir conselhos e nem lições, eu preciso de um favor. Preciso que você cuide do Roger pra mim. É só dar ração e limpar a areia dele. Ele é bastante limpo e não dá trabalho nenhum. A Lola ficou com cara de funeral, e eu conheço cara de funeral. Que cara é essa, relaxa, eu não vou cometer suicídio nem nada, só vou passar uns dias fora. Pipa é o nome da praia, no Rio Grande do Norte. O mesmo nome que eu queria dar pra minha filhinha, se eu tivesse uma. Vou ficar lá uns dias, conhecer um pescador gatão, tipo o Reynaldo Giannechini nas novelas em que ele é um pobretão gato. É, vou namorar um desses. E daí não vou querer voltar mais, mas vou precisar voltar por causa do Roger e do meu apê, que eu não vou conseguir vender. Vai ser lindo aquele drama todo para deixar o Reynaldão de lado e voltar pra cidade. Rimos muito com aquela ideia boba e ela aceitou ficar com o Roger. Quando cheguei na Pipa eu relaxei. Li todos os oito livros que eu levei. Na verdade sete, porque aquele da Virginia Woof me deixou muito profunda e eu tive que parar. Os dias foram passando lentamente, lentos demais. Eu tinha vontade de subir até a lua e agradecer por ela finalmente ter aparecido. A solidão é uma delícia nas primeiras semanas e não tinha nenhum Giannechini para perguntar o meu signo ou pedir um cigarro. Eu já estava parecendo uma mulata e os meus cabelos estavam loiros, bem loiros, como nunca. Resolvi cortá-los como naquele livro do Hemingway, em que a mulher vai ficando super bronzeada e linda, mas louca, e corta o cabelo bem curtinho. Cortei bem curtinho também. Mas não teve nenhum triângulo amoroso e eu não estava em lua de mel como no livro. Quase seis meses depois eu voltei pra capital. Lola ficou em choque, e riu da minha magreza ou dar minha cor, não sei. Cheguei no meu apê e o um cheiro antigo exalou forte. Era um cheiro de amaciante com flores mortas. Abri a janela e comecei a abrir a correspondência. Para Raquel, de Laura. Abri. Era um desenho da minha sobrinha e uma carta "mamãe falou que você quer deixá-la louca, que você sumiu por pura maldade com ela. Eu não acho que você faria isso, porque você gosta muito da mamãe. Cadê você? Estou com saudade e vou acabar aprendendo a andar de bicicleta sozinha, você tá demorando demais para vir me ensinar. Eu já até aprendi a fazer brigadeiro, quer vir experimentar?" Olhei a data no envelope, caiu uma lágrima. A data era a mesma do dia que eu fui para a praia, há quase seis meses. Peguei o telefone correndo.  "Laurinha?"

Reis e as musas

Sabe, uma vez eu ouvi a Lídia dizer coisas ao telefone. Eu sabia que ela falava com Ricardo. Eu tentei pegar na extensão do telefone para ouvir o que ele estava dizendo do outro lado da linha, mas não consegui. Só pude ouvi-la falar com a voz trêmula, aquela voz que a Lídia tinha quando chorava. Eu te amo, mas eu não quero mais chorar. Eu não quero mais me arrepender, e nem ficar doendo. Eu te amo também, e você poderia ser o pai do meu filho como você queria, mas não vai dar. Amar você dói o tempo todo. O nosso filho iria nascer de um corpo doído, um amor doído - ele iria nascer chorando e eu iria recebê-lo chorando também. Certo dia ele pararia de chorar, quando as cólicas passassem e os órgãos dele estivessem todos formados, mas eu não. Eu iria continuar chorando. O nosso amor nasceu errado, ele não vai parar de doer. Nunca mais ouvi Lídia falar de Ricardo, e Ricardo parou de escrever para ela. Mas todos nós sabemos que ela foi tola. Errou feio. Se despediu dele para parar de chorar e continuou chorando até o fim. Ricardo eu já não sei bem, dizem que ele conheceu outra mulher. Uma tal de Natália.

Resposta de jabuticaba

Era uma pergunta que ela não sabia responder, não queria decidir sozinha, queria uma resposta mágica. Como se ela pudesse perguntar a Deus e ele pudesse responder com um raio. Mas ela não acreditava em Deus e nem estava chovendo para que um raio caísse. E esse tipo de resposta óbvia de Deus era coisa de filme. Então ela lembrou que havia um saco cheio de jabuticabas na geladeira. Milhares e milhares de jabuticabas que a empregada havia colhido no parque vizinho. Ela decidiu que as comeria uma a uma até chegar a última jabuticaba - e se a última jabuticaba estivesse doce a resposta seria positiva, se estivesse azeda, negativa. Comeu, comeu e comeu até ficar cheia. Não cabiam mais jabuticabas no estômago, mas ela não ia desistir. Faltavam muitas ainda e ela começou a ficar com nojo da fruta. Mas continuou. Aprendeu a perceber quando a jabuticaba estaria doce e quando estaria azeda. Começou a escolher as mais azedas para se livrar logo delas, mas percebeu que dessa forma ela estaria escolhendo também a resposta que iria receber. Então foi comendo-as todas compulsivamente, como se fossem pipoca. Quando finalmente aquela bolinha preta imprestável era a última que lhe restava para comer, olhou-a, olhou-a, apertou-a e sentiu que estaria azeda pra burro, com um gosto horrível. Abriu a janela da cozinha e arremessou a jabuticaba bem longe.

sábado, 13 de outubro de 2012

Luis Fernando Mãos de Suor

Eu o conheci em uma formatura, em um casamento, em alguma cerimônia na qual os homens usam terno e gravata. Acho que era formatura mesmo, normalmente o primeiro palpite é o correto. Ele estava elegante, como a maioria das pessoas, mas me chamou a atenção porque o cabelo estava completamente bagunçado como se dissesse "estou arrumado só porque sou obrigado a estar", era o modo dele de se rebelar contra a formalidade da festa. Eu sabia que aquele não era o mundo dele. Conversamos por quase duas horas sem saber o nome do outro. Ele estudava psicologia na universidade estadual, morava no bairro nobre da zona sul e tinha 6 anos a mais do que eu. Luis Fernando. Meu telefone eu anotei na mão dele. E tinha certeza que ia virar um rabisco suado. Nada disso. Três dias depois ele me ligou. Me levou a um bar com samba de fundo musical e ficou falando de política. Eu era uma adolescente quase completamente alienada. Não sei porque ele insistiu no assunto depois que eu falei tanta besteira. Acho que ele só queria me impressionar. E impressionava, porque embora ele tivesse dito um monte de besteiras também, eu fiquei impressionada, porque qualquer coisa me parecia extremamente intelectual. Aquele dia nós nos beijamos. Eu não bebi, porque eu não bebia, e ele ficou intimidado com uma mulher (menina na verdade) não beber e pediu uma Sprite. O beijo dele era bom, não lembro bem, mas eu senti medo dele - não pela primeira vez. Eu tinha medo de homens que sabiam o que queriam. De homens que moravam sozinhos, de homens que falavam sério por mais de 4 frases, de homens que sabiam dirigir, de homens que não faziam a barba ou que parecessem intelectuais. É, talvez eu tivesse medo de homens que não fossem mais meninos. No dia seguinte ele ligou, e no seguinte também e no dia depois. Não consegui fugir mais e dessa vez o convite era para ir ao cinema. Eu tinha uma bolsinha pequena, que mais parecia uma carteira. E na hora de pagar, a moça do guichê me perguntou de um jeito meio rude: "você é modelo, garota?" Fiquei roxa de vergonha, mas também toda orgulhosa que a moça do guichê estava me elogiando na frente do meu paquera. Ele riu e falou: "Não, ela é atriz. Já fez duas novelas" E achou a resposta o máximo. Eu também. Ele olhou a minha fotinho na carteira de estudante e sorriu um largo sorriso, de apaixonado? Acho que sim. Entramos na sala. Eu deixei a minha bolsinha em cima da cadeira, ou acho que deixei, e precisei ir ao banheiro assim que o filme começou. Voltei, o trailer já tinha acabado e ele segurou a minha mão. Durante todo o filme a mão dele, em cima da minha, suava e ele a limpava na calça. Eu achei fofo. Demos um ou dois beijinhos e o filme acabou. Ele era um cara legal e me deixou em casa. Assim que eu abri a porta, reparei que não estava com a minha bolsinha. Olhei para trás e ele já havia partido. Eu não tinha celular porque naquela época ninguém tinha celular. Ele não me procurou nunca mais e eu acho que ele roubou a minha bolsinha.

quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Ele assim

Eu soube que ele morreu quase um mês depois. Chorei porque foi um choque e não porque doeu. Fazia anos, muitos anos que eu não o via, nem tinha notícias dele. E eu nem me importava. Imaginava que ele era feliz do outro lado do mundo. Mesmo que essa palavra "feliz" carregue uma certa carga de hipocrisia e eu não concorde com ela. Ele parecia em paz. E que se dane se em fotos todo mundo pareça. A verdade é que eu nem me importava. Eu fui apaixonada por ele dos 12 aos 14 anos e não vou mentir que depois que ele foi embora ainda passei um ou dois anos me lamentando por ter perdido o grande amor da minha vida. Mas foi isso. Ele atravessou a minha adolescência. Talvez tenha mexido com algumas referências, talvez tenha me feito aprender inglês, talvez tenha feito com que eu fugisse de homens por um bom tempo. Passou. Foi isso. Ele faz parte do que eu me tornei em um determinado grau, mas sei lá, não vou fazer drama. A gente supera as pessoas. Doeu quando ele foi embora, há tantos anos, aquela foi de fato a despedida. A morte dele não. Pelas minhas contas tinha 28 anos (ou seria 29?). Esperei para saber se foi doença, acidente, destino. Foi dor. Dor de existir. Dor de sentir tanta dor. Ele não conseguiu aguentar. Eu não faço ideia o que aconteceu, só soube que ele se matou. No dia seguinte que eu soube, eu contei para um amigo: "você sabe o que significa a morte do primeiro amor?" Eu não sei. Será que até o trágico suicídio do meu primeiro amor tem algum significado simbólico? Mas o cara sofria, devia estar insuportável, como isso pode significar alguma coisa para alguém do outro lado do mundo, alguém tão do passado? Como isso pode significar qualquer coisa para qualquer pessoa? Ele não entendia algumas coisas que eu, como menina apaixonada, fazia para chamar a atenção dele e às vezes acabava me esnobando sem querer. Dava risadas divertidíssimas, e não entendia por que eu ficava brava. Mas depois ele se desculpava disfarçadamente, quando ninguém estava olhando. Ele era tímido e lindinho. O nosso adeus foi desencontrado. Eu fui procurá-lo na casa dele e naquele exato momento ele foi me procurar na minha casa. A gente se cruzou no meio do caminho, mas ele não conseguiu dizer nada, tímido que era, e só sorriu. Eu sorri de volta e a gente nunca mais se viu. Foi isso que ficou, e eu lembro dele assim: sorrindo um adeus.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Enquanto atravessava a cidade

"Me arrependi de você". Foi há algum tempo que ele me falou isso. Ele não olhou nos meus olhos, e por isso não viu que as palavras dele fizeram dos meus olhos uma janela emoldurando a chuva. Me doeu da unha aos ossos, pelos, cabelos. Me doeu o peito. Eu me vi atravessando a cidade e me perdendo em ruas escuras às três da manhã em direção ao apartamento dele. Me vi no apartamento dele, tentando disfarçar o meu medo daquilo tudo e ouvindo ele corrigir o que eu dizia, porque eu dizia muita bobagem. Eu me vi chorando na volta, cheia de álcool no sangue, entrando em todas as ruas do país antes de descobrir que eu estava na direção contrária da minha casa. Eu me vi chorando em casa, no banho, limpando o choro. Eu vi a quantidade de vezes que eu atravessei a cidade, que eu me enfiei no peito dele, na cozinha da casa dele, no mundo dele. Eu sempre fui sozinha e já havia dito a ele que tenho uma espécie de pacto com a solidão. Ele talvez não entendeu, talvez deixou passar, talvez esqueceu. Não me importa, ele me disse que se arrependeu.

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Asa de borboleta

Ela foi assaltada, como todo mundo é nessa cidade, como todo mundo nessa cidade sabe que vai ser um dia. Mas com ela foi diferente. E foi diferente porque ela é diferente de todo mundo nessa cidade. Ela buzina, dirige mal, corre, se estressa e grita palavrões horrendos no trânsito. Mas ela é quase de vidro. Não, vidro até que é resistente, ela é feita do mesmo material que a asa de uma borboleta. Você já tocou na asa de uma borboleta? Ela se desfaz na mão. Deixa um brilhinho nos seus dedos e desfaz. Ela é isso. E quando o adolescente quebrou o vidro do carro dela, ameaçou-a com uma faca e ela viu de perto aqueles olhos drogados, ela se desfez. Deixou um brilhinho no banco do carro e sumiu. É claro que o corpo dela estava ali, em lágrimas, mas quem a conhece sabe que ela de fato não estava. Eu tenho tanto ódio daquele menino, porque o que ele fez com aquela asa de borboleta vai ser difícil consertar. Ela já era medrosa, ficou mais. Já tinha medo de dirigir, tem mais. Ela já tinha pesadelos, acordava chorando. Eu não quero pensar como vão ser as noites dela agora. Eu queria mesmo era velar o sono dela a noite toda. E se ela acordasse num susto, de repente, eu faria que nem ela fez comigo quando o meu primeiro amor foi embora. Eu não conseguia dormir, chorava, chorava, chorava. Não conseguia fazer mais nada. Ela entrou no meu quarto no meio da madrugada, acendeu a luz, pegou um caderno no chão, uma caneta e fez um jogo da velha. "Vai, é a sua vez." Depois de duas partidas eu roncava que nem um porquinho na lama. Acordei doze horas depois. E foi assim durante várias noites, até eu cicatrizar aquele amor de criança. Eu queria jogar jogo da velha com ela, até o brilhinho da asa de borboleta voltar, até a borboleta voltar a achar que o mundo são flores. Porque o mundo não são flores, o mundo é horrível, o mundo são meninos drogados que ameaçam pessoas, eu não quero mais falar sobre o que o mundo é, me dá dor. Mas ela, ah, ela deixa brilhinho de borboleta nas mãos.

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Enxergo bem sem eles

Detesto quando alguém pega os meus óculos pelas lentes. As digitais ficam marcadas e é chato para tirar. Quando ele pegou os meus óculos no meio da festa foi pior: os dedos dele estavam engordurados. Ele estava bêbado e cheirava a perfume feminino, como se tivesse acabado de sair de um abraço, ou pior: de uma mulher nua enrolada num lençol branco. Eu não aguentei aqueles dedos. A minha vontade era de pegar uma faca, como no filme Silêncio dos Inocentes, e fazer o que o Hannibal ameaça fazer com o pulso da mocinha. Essa era a minha vontade. Ao invés disso eu deixei ele pôr os dedos imundos nos meus óculos e ficar se exibindo que nem um babaca pela sala. Ainda bem que a música era alta o suficiente para que ninguém ouvisse o que ele gritava. Só eu ouvia, porque eu já havia quase decorado as coisas que ele dizia quando ficava bêbado. Eu saí, fui ao banheiro e procurei pelas gavetas: na casa da Bia sempre tinha uma cartela de antidepressivos no banheiro de visitas. Ela tinha uma filosofia infantil segundo a qual antidepressivos deviam ser compartilhados. A Bia era uma cretina. E eu estava certa: os comprimidinhos brancos estavam ali, lindões. Tomei um e fiquei sentada na privada esperando algum efeito. Quando eu acordei às 6h14 da manhã de sábado os meus óculos estavam imundos, jogados do lado do lixo. Eu estava toda torta no chão do banheiro, meu cabelo estava igualzinho ao do Wilson, o amiguinho-bola do Tom Hanks. Eu lembro de passar a noite tentando caber naquela droga de tapetinho minúsculo porque o chão ardia de tão gelado, mas eu tenho 1,68m de altura e o tapetinho tem o tamanho de um tapetinho. Lavei os óculos por 23 minutos sem perceber que eles já estavam brilhando, e que eu estava pensando na morte da bezerra. Não, eu estava pensando por que o V. havia largado os meus óculos no chão do banheiro. Fiquei imaginando que ele estava tão bêbado que nem me viu, ou tão bêbado que nem percebeu que eu era a Bela Adormecida. Depois que eu sequei as lentes, joguei os óculos no chão e como eles não quebraram, eu pisei em cima. Ao vê-los espatifados, eu comecei a chorar, mas eu enxergo bem sem eles. Saí pela casa à procura da minha bolsa, e quando a encontrei passei a ficar desesperada para sair dali, mas fui interrompida por uma lembrança. A foto. Eu tinha uma foto de nós dois dentro da bolsa: eu e o V. abraçados no cais. A represa atrás da gente foi cúmplice do nosso amor de cinco dias. Os exatos cinco dias mais felizes da minha vida, ou talvez os únicos. Rasguei a foto em mil pedaços. Tive vontade mesmo era de rasgar os meus olhos.

domingo, 9 de setembro de 2012

12, 14, 14.

Eu tinha doze anos quando meu pai saiu de casa. Era dia quatorze de outubro. Eu lembro direitinho da época, eu estava apaixonada pelo Bruno, um menino da minha sala. Eu não conseguia olhá-lo nos olhos, então lembro direitinho de todos os tênis que ele usava. O meu preferido era um que tinha um galo desenhado. A marca chamava Leco alguma coisa. Lecospirit? Não lembro. Meu pai não falou tchau pra mim e nem para os meus irmãos, é claro. A gente era muito pequeno. Mas a minha mãe foi sacana. Ela estava ressentida e cheia de amargura, então se vingou do meu pai por meio da gente. Ela entrou no quarto de brinquedos e falou bem alto: o papai foi embora. A gente nem olhou para ela. Eu estava montando uma casa para a Ariel, e a parte da cozinha sempre dava muito trabalho, eu tinha que me concentrar porque se caísse um copo, todos cairiam junto. Acho que o Dudu estava jogando tetris, não sei, ele não tirou os olhos das peças que caíam. O Lucas com certeza estava jogando Super Nintendo. Ele não largava aquela droga. A mamãe ficou furiosa. Meninos, o papai foi embora de casa. Ele não vai voltar, ele largou a gente. E começou a chorar. A gente já tinha se acostumado a ver a mamãe chorando, mas dessa vez ela caiu no chão. Ficou de joelhos. O Dudu foi o primeiro que levantou. Ele, em pé, tinha a altura da minha mãe de joelhos. Abraçou ela. Ele falou: o papai volta sim. Ele não consegue ficar muito tempo sem comer o seu bolo de laranja! Tadinho. Eu me aproximei. Confesso que fiquei com medo daquele abraço. Eu sabia que o papai não voltaria, eu sabia que aquela droga de abraço ia ficar registrado. Eu sabia que o buraco ia existir para sempre. O Lucas ficou olhando pra gente. Ele não veio. Ele desligou o videogame, passou do nosso lado e foi pro quarto. Eu pensei no Bruno da escola. Será que ele ia abraçar a mãe dele ou ele iria passar reto e ir pro quarto? Fiquei triste, porque eu não ia poder contar pro Bruno o que aconteceu. Eu nunca tinha falado com ele na vida. Aquele abraço durou uns cinco minutos, mas é claro que na minha cabeça parece que foram algumas horas. Parece que eu saí daquele abraço já adulta. Não sei mais o que aconteceu depois, não lembro do dia seguinte, mas eu lembro de duas semanas depois. O meu pai ligou. Eu vi que era ele logo de cara, porque ele pigarreou daquele jeito nojento. Eu atendi o telefone, eu tava sozinha em casa. A casa da Ariel tinha ficado linda, mas eu quase não conseguia andar no meu quarto. Eram ermários em miniatura, tapetinhos, cadeirinhas, tanta coisa. Demorei pra conseguir desviar de tudo e ir para o quarto da mamãe atender. Quando atendi ele ficou mudo. Eu esperei, esperei, e quando ele pigarreou eu falei: pai? E para a minha surpresa ele não desligou. Pai, eu acho que não gosto mais da Turma da Mônica. Acho que cansei de ver a Mônica sempre brava, o Cascão sujo. Sei lá, acho que eu não gosto mais de nenhum deles. Meu pai sorriu. Eu sei, porque eu sei. Eu queria que ele insistisse na Turma da Mônica, foi ele que me deu de presente a assinatura dos gibis. Eu queria que ele ficasse bravo, triste, que ele chorasse. Mas ele não chorou, ele sorriu. Eu tinha separado todos os gibis numa caixa, e deixado do lado de fora de casa, para o cara da reciclagem levar embora. Meu pai não desligou e eu sentei no braço do sofá, fingindo que era o colo dele. Desengatei a falar sem parar. Falei do Bruno, da professora de matemática que detestava ser professora, da casa que eu montei para a Ariel, do novo amigo ridículo do Lucas. Uma hora ele falou comigo. Eu quase caí do sofá. Ele disse: e a sua mãe? Eu menti. Ela está diferente, linda. Saindo muito. Mentira. Mamãe estava igualzinha, um pouco mais triste, mais gorda e nunca saia de casa. Ele suspirou, disse: Eu preciso ir, desculpa. E puff. Desculpa por que ele precisou ir naquele momento ou desculpa por que ele largou a minha mãe, eu e os meus irmãos pra sempre? Nunca mais eu ouvi o meu pai. Até ontem. Ligaram do hospital. Meu marido que atendeu. Câncer, dá pra tratar, o diagnóstico foi cedo. Venham sim. Quarto 14. No dia 14 de outubro meu pai saiu de casa. Eu entrei no quarto 14, e de repente eu perdoei o meu pai.

quinta-feira, 6 de setembro de 2012

quarta-feira, 5 de setembro de 2012

Ela

Será que ela se incomoda se eu ficar olhando-a de longe, julgando os seus defeitos imaginários, imaginando como serão os seus filhos, invejando a sua calma?
I miss being free.
Was I ever free?
I miss it anyway.

Deixei o sangue pulsar


Eu ia escrever uma carta, mas o grito que vinha de dentro era alto demais. Uma carta não bastaria. Eu ia aparecer no meio da sala da casa dele, fechar a janela e dizer tudo o que eu queria dizer. Mas eu tive medo. Medo de entrar lá e não sair nunca mais - igual a todas as outras vezes. Eu ia ligar, eu ia ajoelhar, eu ia abraçá-lo até sair sangue. Mas eu não fiz nada disso. Eu me calei. Eu deixei o sangue pulsar. Eu o via de longe e guardava o grito, guardava o choro, guardava o coração de volta no peito. Eu não disse nada e ele foi embora. Ele desistiu tranquilamente, resignado e em paz. A mesma paz que ele me roubou.

domingo, 2 de setembro de 2012

Einstein era um cara tranquilo

(e nas horas vagas era gênio)

Agosto

Agosto é um horror. Agosto é um mês amargo pra caramba e dói, como dói. Os dias passaram em agosto como pequenas lâminas na garganta de um gatinho. Foi assim que passou agosto. Mas ele passou, e deixou setembro no lugar. Largou-o na porta da minha vida. Eu não abri a maldita porta, porque agosto havia me feito sangrar, mas setembro não ficou parado: ele abriu a porta sozinho. Maldito agosto, maldito setembro, maldito gatinho.

Divago

Há fim para o luto do amor?
Há amor para o luto do fim?
Há luto para o amor sem fim?

sábado, 1 de setembro de 2012

O sol se punha tão lindo lá fora

Não sei por que exatamente mas passei a me sentir triste de novo. Senti a falta de um ritual, porque não ter ritual nenhum me pareceu ruim. Um ritual para abrir o iogurte, para levantar da cama, para me vestir. Eu nunca fazia as coisas do mesmo jeito. Acho até que era de propósito, para enganar o tempo. Eu me sentia desconexa do mundo, não só dele. Como se todo mundo estivesse fazendo alguma coisa e eu não estivesse fazendo nada. Como se eu estivesse dentro de uma sala sem nenhuma janela e não pudesse ver o sol se pôr. E o sol se punha tão lindo lá fora. Como se houvesse um silêncio medonho, que só eu escutava. Eu tinha coisas para falar para ele, mas quando a gente se encontrava, eu esquecia tudo. Isso não era bom. Eu não estava apaixonada, eu não estava nada. Estava acordando, comendo, dirigindo, fazendo esportes e dando risadas, as velhas gargalhadas de sempre, mas o que mais? E depois? E o meu peito? Não era para eu estar ansiosa para qualquer coisa? Não era para eu estar feliz ou triste ou com raiva ou? Eu não estava nem ou. Eu estava eu. E estar eu naquele momento não me despertava nenhum interesse. Eu estava apresentando um programa de TV e absolutamente ninguém estava assistindo. Dá para entender? Acho que ele não entendia, não fazia a menor ideia sobre o que eu estava falando. Eu também não fazia. A gente foi se afastando, eu não gostava mais de ficar sentada do lado dele sem fazer nada. Eu ficava ouvindo os pensamentos dele, e eram tão chatos. Me dava aflição. Quase falava para a mente dele calar a boca. Eu calava a minha. Ele, distraído como sempre, nem percebia a minha aflição. Sorria com aqueles olhos calmos. Fazia café, sentava, lia o jornal. Eu ali, quase desaparecendo de mim, mas ele não via nada. Olha aqui, descobriram a cura do câncer, linda. Que câncer, o meu? Não, linda, que bobagem é essa. E eu ficava calada. Pensava no câncer imaginário comendo os meus órgãos. Será que ia chover no meu funeral? Eu acho tão triste aquele clichê de chuva em funerais. Acho bonito. Aquela história completamente imbecil de que o céu estaria chorando. Eu queria uma tempestade no meu. As pessoas iam achar tão estranho. Elas não iam conseguir ouvir o próprio choro. Meu funeral ia ser cancelado, e eu ia ficar sozinha de novo. Quer mais café? Não, eu quero sumir um pouquinho. Mas eu não sumia. Eu nunca sumia quando eu queria. Só quando eu não queria. O jornal que ele estava lendo acabava, e me irritava o fato de ele ler até os classificados. Não tem mais nada para ler? Já leu tudo, a errata, tudo? Ele ria. Pensava que eu estava fazendo graça. Eu não dava risada. Eu aprendi que com ele eu não precisava rir. Esse negócio de ter que rir quando o chefe conta uma piada, de ter que rir quando um vendedor conta uma piada, quando sua irmã conta uma piada, quando você mesmo conta uma piada. Eu gostava de fumar na janela, estava com essa mania. Ficava passando frio e fumando. Adorava passar frio, era um sofrimento tão gostoso. Ainda mais porque a vista só era linda quando a janela estava aberta e sempre ventava muito. O cigarro me deixava sem fome e eu fui ficando magra, fazendo o meu desaparecimento não ser mais coisa da minha cabeça, eu estava literalmente desaparecendo. Ele vinha, colocava um cobertor sobre mim quase sempre, e eu deixava porque já estava espirrando demais. Naquela noite específica eu tirei o cobertor das minhas costas e resolvi sair. Para onde você vai? Para o fim do arco-íris, eu falei. Ok, mas então traz aquele iogurte de cenoura com mel, porque você tomou todos e eu fiquei sem nenhum. Trago, trago tudo que você quiser. Saí. Eu entrei no meu carro tão em paz. Uma paz estranha, estranha demais. Eu não me despedi dele, porque já estava voltando. Ele achou que eu ia pegar a minha bolsa e ficou esperando um beijo meu, mas eu saí sem bolsa. Fiquei cansada de dirigir sem destino, passou a ficar sem graça, então eu acelerei. O carro rodou na pista várias vezes antes de atravessar a grade de segurança e cair na pista de baixo. Ele rodou assim porque eu freei. Eu não sabia o que eu estava fazendo, e freei porque de repente me dei conta. Mas foi muito tarde. Quando chegou um homem, eu acho que era Deus não sei, ele era negro, falava estranho, nada com nada. Talvez eu não estivesse mais entendendo nada mesmo. Eu só vi a cara de pânico dele e mais nada. E foi só. E foi sem querer. Eu me morri, sem querer morrer. Se eu queria, eu queria bem pouquinho, mas me deixei levar por esse pouquinho. Mas olha, ainda bem que eu não fiquei para ver a minha família recebendo a notícia. Acho que eu morreria tudo de novo. Não devia ter feito aquela besteira. Eu devia ter tomado um remedinho, ter saído daquele apartamento, ter viajado com as minhas irmãs. Mas eu fui burra. Tudo bem. No final das contas, todo mundo me perdoou. Na verdade, só a Lidia me perdoou, porque só ela sabia que eu não tinha sofrido um acidente. As outras pessoas ficaram achando que a vida era injusta mesmo, e sentiam muita tristeza por mim. Ainda bem, acho que doeria mais para eles saber que eu não estava feliz, como o mundo manda a gente ser, e que eles podiam ter feito alguma coisa. Mas é bobagem isso, ninguém podia ter feito nada. Só chorar no meu funeral. Eu fiquei feliz depois de tudo, porque ninguém cancelou o meu funeral. Não choveu, mas ventou bastante. Foi um fenômeno meteorológico qualquer que fez uma espécie de furacão, sei lá o quê, e a defesa civil soltou um alerta dizendo que ninguém deveria sair de casa. Mas todo mundo saiu. Não faltou ninguém. Foi bonito. Foi triste. Foi assim. Eu me morri sem querer. E não tive mais volta.

sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Um Pessoa

Para cada passo, cada suspiro, cada desgosto
Para cada sorriso, cada decepção, cada vazio
Para cada frio ou calor, amor ou abandono, para cada moça, cada amigo,
cada filho (embora ele só tenha um), para tudo que o faça mover-se
ele tem um Fernando Pessoa.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

30 de julho de 1914

Ricardo tinha dedos grossos.
E foram aqueles mesmos dedos que desfizeram o nó.
Era um nó apertado, mas foi desfeito.
O nó que amarrava a venda nos olhos de Natalia.
Natalia passou a ver o rio (e não só ouví-lo de longe).
Ela nunca mais foi a mesma. 
Ricardo tinha dedos grossos,
mas era o homem mais doce que Natalia já conheceu.

terça-feira, 21 de agosto de 2012

Said to be wrong

I am sitting here learning about the silence. It's been so long since I last heard silence. If anyone tell me that I am scared of silence, I might agree. I avoid it. I think a lot of people do, but I even avoid it when it comes from inside of me. It's sad and it's said to be wrong. So here I am learning about the silence, and hating it even more.

Existir

A primeira vez que eu ouvi esse termo foi aos 18 anos. Um homem mais velho me falou: você é a pessoa mais nova que eu conheço que sente a dor de existir. Ele lia todos os meus textos, e achava que a maioria deles eram bobos, imaturos, inocentes, mas alguns - poucos - eram intensos demais. Demais para uma garota de 18 anos, boba, descobrindo a vida. Eu achava que aquilo que sentia era inato em todo mundo. Jamais diria que era uma dor. Uma culpa talvez? Não, acho que não. Eu apenas sentia. Hoje é completamente claro para mim: dor de existir. É exatamente isso.

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Não ocupo

Sempre tentei fugir ou pelo menos me esconder da minha enorme insignificância. Mesmo dentro do meu quarto, ela - a insignificância - grita. É ensurdecedor. Tanta gente convive numa boa com ela. Eu não. Mas até que deu pra desviar. Semanas, meses. O problema é que existem dias em que ela resolve aparecer e esfregar na minha cara o tamanho do espaço que eu não ocupo. Dói ser quase de ar (e somos todos).

terça-feira, 31 de julho de 2012

desenlacemos as mãos

Fernando Pessoa foi ficando para trás.
As mãos ficaram muito distantes,
e já não se alcançavam mais.
Cansar-se já não era problema:
ele escolheu calar-se.

Gustav Klimt

Yes, I think you chose the right painting. Yes, I really like the painter and yes, you have good taste. I like the fact that we've spent so much time during lunch talking about art. I also think that you are special. I do like you. Thank you. Goodbye.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

Desperdiçados

Ela encostou a cabeça no peito dele. Ouviu o seu coração quase parando. Logo percebeu que os corações deles já não batiam igualmente, mas continuou feliz mesmo assim: o dela batia pelos dois. Eles passaram a tarde ali, olhando os ponteiros do relógio, serenos, em paz. Sem dúvidas, ela estava feliz. De repente ele falou, como quem pergunta as horas: "detesto domingos assim, desperdiçados".

Cabelos

Ela cortou os cabelos pensando que alguma coisa mudaria.
Quando viu as mechas caindo, aos poucos, no chão do salão
-- chorou.
Deram-lhe água, café, tiraram-lhe o espelho.
Nada adiantou.
Ela chorava porque percebeu que, naquele dia ou nos próximos,
nada mudaria.

Minhas mãos

Minhas mãos voltaram a se parecer com mãos de uma menina de cinco anos (como se roer as unhas fosse resolver alguma coisa).
If you say you miss me, how come it seems like you just don't care?

domingo, 22 de julho de 2012

você fez isso porque já estava querendo ir embora?

entre-aberta


Fechei tudo:
-- portas, malas, olhos
aos poucos, silenciosamente.
As coisas assim, fechadas,
parece que ficam mais bonitas.
Mas o tempo não passa.
Resolvi, então, abrir tudo de novo:
-- os olhos, a janela, o peito.
O ruído foi alto,
quase me ensurdeceu.
As coisas assim, abertas,
são um perigo
(de pegar resfriado,
de entrar água, de acabar de vez).
Que jeito, meu Deus?
Não há meio-termo.

Dói tanto em mim
Esse horizonte inteiro
Sem nenhum pedacinho de ti.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Enquanto isso na Alemanha Oriental

Ele falava sem parar
e ela só queria escutar
-- tanta coisa interessante.
Risadas, cerveja e pedidos de casamento.
Mas na Alemanha Oriental é tudo meio proibido.
É tudo meio em segredo, meio escondido:
não podiam entrelaçar as pernas.
Mas, bem no centro da Alemanha Oriental,
as pernas, distraídas, entrelaçaram-se.

terça-feira, 17 de julho de 2012

The art of losing

Te falei de um poema da Elisabeth Bishop, e aqui está. É bem possível que você nem se lembre de quando eu falei dele, mas eu falei sim. Ele é bastante conhecido. A tradução talvez não seja tão linda, mas preferi deixar em português.

A arte de perder

A arte de perder não é nenhum mistério;
Tantas coisas contêm em si o acidente
De perdê-las, que perder não é nada sério.
Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,
A chave perdida, a hora gasta bestamente.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Depois perca mais rápido, com mais critério:
Lugares, nomes, a escala subseqüente
Da viagem não feita. Nada disso é sério.
Perdi o relógio de mamãe. Ah! E nem quero
Lembrar a perda de três casas excelentes.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Perdi duas cidades lindas. E um império
Que era meu, dois rios, e mais um continente.
Tenho saudade deles. Mas não é nada sério.
– Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo
que eu amo) não muda nada. Pois é evidente
que a arte de perder não chega a ser mistério
por muito que pareça (Escreve!) muito sério. 

Tradução de Paulo Henriques Britto

Cannot

Não consigo.
Eu simplesmente não consigo.
Não não não.
Me chame de covarde,
mas não diga que eu não tentei.

domingo, 15 de julho de 2012

Meu amor,

A bateria do meu computador vai acabar em instantes, mas eu preciso te dizer uma coisa muito importante, é que eu

Partes

Partir em partes, partir, estar partida, dar partida, estar perdida, perder-se, perder a partida, perder em partes, várias partes, partes demais, tarde demais. Adeus.

Restos

Algo comeu a poesia de dentro de mim,
a minha leveza e a minha doçura (o que eu tinha dela).
Algo comeu o que eu tinha dentro de mim.
Não restou muito,
e eu quero o que eu tinha de volta.
Está muito difícil só com restos:
estou toda feita de restos,
nem me reconheço mais.
Eu sou paciente e estou só esperando para ver como é que eu vou sair dessa.

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Antes de ir embora


Eu só queria você sempre leve.
Igual àquele dia, quando você dormiu que nem um bebê
-- por causa de mim.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Primeiro domingo

Ela prendeu o dedo na porta e começou a chorar como um bebê. A dor passou, mas ela continuou chorando, e de repente ficou óbvio demais que não chorava mais de dor. Ou pelo menos não por causa do dedo. E ele ficou preocupado. Não sabia mais o que fazer para que ela parasse de chorar. E ele percebeu que ele não podia mais fazer nada. Ele percebeu que ela estava procurando desculpas para ir embora. Ela chorava e se despedia com o choro. Ia dizendo adeus baixinho. Esqueceu-se do dedo, da porta, esqueceu por que chorava, por que estava ali. E foi. Ele ficou parado, sem saber o que fazer. Era o primeiro domingo que ia passar sem ela. Não ia ser fácil, mas era tarde demais. Ela já tinha sumido no horizonte.

sexta-feira, 22 de junho de 2012

Essa outra

Estou sentindo muito frio. Tem um casaco bem aqui do meu lado, mas eu não quero vesti-lo. Quero sentir frio, congelar. Talvez se o meu corpo doer de frio, ele para de doer essa outra dor.

Pouco tempo

Eu lembrei de você hoje. Depois de tanto tempo, os meus pensamentos evocaram o seu jeito de fazer piadas, as coisas todas que você tinha tanto prazer em me ensinar, a sua impaciência de às vezes, tanta coisa. Tanta coisa. Foi pouco tempo, mas hoje eu disse que é difícil se desvincular de pessoas depois de muito tempo com elas, porque elas ficam marcadas em todas as coisas, em todos os sons, em tudo. Alguém então me respondeu que o tempo nessas horas não faz tanta diferença, porque às vezes ficar pouquíssimo tempo com uma pessoa pode ser tão difícil quanto um tempão. Quatro meses. Eu acho que foram quatro meses. Eu nunca mais me esqueci das coisas que você me ensinou. Mas sabe, a única coisa que eu me perguntei hoje foi se você, neste momento, estaria cuidando de mim, enxugando as minhas lágrimas, me dando um abraço, daqueles que você não gostava de dar. Porque eu estou tão sozinha. Tão sozinha, sabe? Igual a você, na última vez que eu te vi.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Chopin

Só ouço Chopin ultimamente.
A tristeza que ele tocava chega a doer de tão linda. 
Se ele fosse feliz,
o que seriam dos noturnos?
Ainda bem que ele era triste, triste, triste.

Para:

Cliquei em "enviar" e o gmail me avisou que eu precisava de um destinatário. Eu não tenho um destinatário no momento. Não posso enviar para o infinito? Não posso enviar para a Clara do futuro?


sábado, 16 de junho de 2012

2:30 am

Você ficou na porta, fazendo cara de quem estava triste. Mas acho que você só estava com sono. Eu fui embora. Aquela típica cena de adeus - o homem na porta, olhando o carro se afastar. Eu, no carro, via o homem na porta se afastar. O homem na porta, a casa, aquela fase, aquele amor, tudo se afastando. Eu fui embora, às duas e meia da manhã. Eu tinha chegado para ficar, mas fui embora. Às duas e meia da manhã, para sempre.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Frase

Eu ouvi essa frase em um filme: "why did you had to happen, just when I was doing so good without you?"

sábado, 9 de junho de 2012

De longe

Típico de uma paixão passageira, completamente passageira.
Tão passageira, que ela colocou os óculos e ele ainda estava lá.


Absent

You said you couldn't come that day.
I was very upset,
at first.
But then I realized I could write much better
when you were absent.

quinta-feira, 7 de junho de 2012

I've been keeping to myself

The things I wanted to say
will never come out the right way
will never come out.

Os pés

Não te ver aquele dia foi estranho. Eu te via todos os dias. Foi estranho e triste. Mas até que eu me saí bem. Eu acho que ninguém percebeu que eu estava em pedaços. Vários pedaços, mini-pedaços. Todos caídos no chão. As pessoas iam andando e pisando neles, tranquilamente. Seria tudo bem, se algum daqueles pés fosse o seu.

terça-feira, 5 de junho de 2012

Aquele jazz

Chovia lá fora,
mas ela não sabia.
Lá dentro o tempo não existia.
O convite se perdeu na chuva,
mas ele não sabia.
Ela não aceitaria nunca mais. 

segunda-feira, 4 de junho de 2012

quarta-feira, 30 de maio de 2012

Cinquenta minutos

Ela sentou na poltrona. Ficou à vontade, como sempre fica, e começou a falar. Tudo bem, tudo tranquilo, sem grandes novidades. Na verdade talvez eu tenha alguma coisa para você, ela disse. E falou dele. Só dele. Da cortina que ele cismava em ficar atrás. Ela tentava dar uma espiada de vez em quando, mas não via muita coisa. Ela estava ficando cansada. Os anos estavam passando e a cortina dele continuava fechada. Ela começou a sentir aquela sensação que há tempos não sentia. Aquela sensação de que alguma coisa estava presa na garganta, de que havia uma tristeza no meio daquela tranquilidade. Ela levantou da poltrona e lembrou do primeiro dia que entrou naquela sala, a vontade de chorar voltou, depois de tantos anos.   

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Beco

Estou tão sem foco, que já não adianta mais usar óculos ou operar os olhos. O foco já não existe mais. Estou perdida, irremediavelmente perdida. Não sei se vou ou se fico, nem mesmo se quero ir ou ficar. E você também não pode me tirar dessa falta de tudo, porque você faz parte dela.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Formingas, máscaras, impostos

Ele olhou para a amiga bem nos olhos, e perguntou: "O que foi?". Só isso. Mas ela quis desabar. Só de olhar para ele. Tantas coisas, meu amigo, tantas coisas. Mas ela ficou quietinha. "Nada, estou ótima" e continuou usando a máscara de sempre, aquela que a faz parecer uma fortaleza. Ridícula, era na verdade de papel a máscara. Lá dentro ela sabia que era uma droga de uma formiguinha, sempre fingindo ser maior, uma onça, um tigre, um gavião. Qualquer outro bicho, qualquer outro lugar. Não me olha assim, amigo, pelo amor de Deus, que eu começo a te contar tudo e eu sei que ninguém está interessado de verdade. A gente precisa ganhar dinheiro, pagar as contas, os impostos. Não vamos ficar pensando nessas outras coisas. Eu não vou te falar. Amanhã passa, ou depois de amanhã, ou algum outro dia. Eu não quero mais ser formiguinha, não quero mais estar aqui. Logo logo alguém chega e pisa em cima de mim. As pessoas não enxergam essas porcariazinhas desses insetos minúsculos que ficam atrás dos doces. Pra que diabos servem as formigas? "Tá bom então, mas melhora essa cara porque não parece que está tudo ótimo." Ela correu para o banheiro e lavou o rosto. Pôs a máscara. Voltou ao trabalho.

Não vou dizer

Irônico, mas eu não tenho mais o que dizer. Tanta coisa presa nesse peito pequenininho, tanta coisa presa na minha cabeça que não me deixa dormir, mas eu não tenho o que dizer. Não posso dizer, não tenho como dizer, eu não vou falar. Queria, talvez, que você falasse por mim. Que você parasse de andar correndo com os braços balançando. Eu não posso dizer, mas eu estou mais uma vez com medo do mundo lá fora.

sábado, 5 de maio de 2012

Trevo de quatro folhas

Obrigada por me fazer pensar com as suas palavras.
Obrigada por me mostrar o meu valor, e obrigada por me achar tão especial.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

No travesseiro

Quando você não dorme em casa eu já chego desanimada do trabalho, porque eu sei que não vai ter nada no meu travesseiro. Nenhuma surpresinha, nenhuma maquiagem, nenhum docinho, nada. Ontem eu fiquei imaginando como vai ser quando eu sair de casa, ou você sair. Não consigo nem pensar a tristeza sem fim que vai ser saber que nunca, nunca mesmo, nenhuma surpresa vai estar me esperando no travesseiro.


Para minha irmã

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Cinza e branco

Hoje fez um dia frio, meio misterioso. Uma chuva que não parava, cores frias. Um tempo que todo mundo chama de feio. Hoje eu não chamei. Eu gostei de todo esse mistério, me fez companhia.

quarta-feira, 25 de abril de 2012

sete de março de dois mil e doze

Eu ia te fazer uma surpresa. Chegar no seu trabalho logo cedo e ser a primeira a dar parabéns. Quando cheguei, você digitava coisas, super concentrado no computador. Nem me viu. Fiquei parada na sua frente por alguns segundos. Até a hora em que você levantou os olhos. A surpresa foi toda minha. A sua cara. Eu nunca vou me esquecer da sua cara. Você mudou completamente a feição. De bravo e sério para um sorriso de orelha a orelha. Tudo no seu rosto sorria. Foi como se você tivesse visto a coisa mais linda do mundo. Mas não, era eu. Você estava louco de felicidade porque eu estava ali. De todos os "eu te amo" que você disse para mim, esse foi de longe o mais lindo.

terça-feira, 24 de abril de 2012

E. Hemingway

So you said he likes cats. So you said he writes stuff. I don't think I will like him, he seems lonely. I am lonely enough. "The Old Man and the Sea" that is a very sad name for a book. I'll bet it's a melancholic story about a guy who is alone in the sea and he's obsessed with a fish. Am I right? I'll bet he won't be successful, people will read and forget. Ernest, what kind of name is that?

Quero saber

Quem é você? De onde você vem? Por onde passou? O que você trás consigo? O que você quer? Por que está aqui? O que você sente? O que gosta de ler, de escutar? Você é sozinho? Para onde você foge, quando foge? Quem são seus melhores amigos? O que é você? De que você é feito, o que você sabe fazer?

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Eu só não sou mais sozinha, porque às vezes eu me faço companhia.

Caixa de postais

Eu tinha medo dele, não sei por quê. Não sei se era porque ele morava sozinho, porque a família dele estava longe demais, ou porque ele tinha planos demais, concretos demais. Eu não tinha nada. Mal conseguia ver o dia seguinte. Eu tinha medo também porque ele queria me mostrar tudo, ele queria me ensinar tudo e eu não tinha nada para ensinar. Eu lembro quando ele pegou uma caixa enorme cheia de postais, fotos e papéis antigos. Lindos. Ele até me deu alguns dos mais bonitos. Eu lembro que fiquei encantada. Era um quarto pequeno, mas tão cheio de vida, de histórias, de conteúdo. Confortável. E eu cheia de medo de entrar na vida dele. Eu cheguei em casa e fui correndo montar um mural de fotos e postais. Queria deixar o meu quarto com vida. Com um pouco dele. Uma vez ele me levou ao último andar do prédio. A gente ficou olhando a cidade. Ele tinha duas tartarugas. Eu não lembro os nomes, mas lembro que ele gostava delas com um orgulho infantil. Ele não sabe, mas eu achava ele incrível. O problema é que eu sempre tive medo dele, até quando eu liguei uns dois anos depois. Continuava com medo. E foi o meu medo que disse aquele "até logo" fatal. Não fui eu.

quarta-feira, 11 de abril de 2012

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Tem dias assim:

Eu não sei o que fazer com você.
E quando me falta você -
Aí é que eu não sei o que fazer.

segunda-feira, 2 de abril de 2012

Bom-bom

É tudo meio torto mesmo:
O certo parece errado,
A distância parece mais distante ainda.
É só uma fase,
Como qualquer outra.
Pétalas vão cair,
Mas a flor sempre renasce.
Você, como uma boa flor,
Vai surgir mais cheirosa,
Só para humilhar o resto do jardim.
Eu te conheço, sei que vai ser assim.
 (Para M.)

Nothings lasts forever...

...So what makes love an exception?

quarta-feira, 28 de março de 2012

db

Como um personagem de infância, hoje eu te procurei.
Encontrei escritos antigos, mas não você.
O seu nome foi o que me fez sorrir hoje, quando eu quis chorar.
Você é o meu personagem de infância, e eu queria saber se você é real.

terça-feira, 20 de março de 2012

segunda-feira, 12 de março de 2012

Um botão

Ele dirigia, ela imersa em pensamentos. Ela tem um botão. Um botão de desligar. Ela aperta o botão quando quer pensar em outras coisas, quando quer evitar a realidade, quando não quer estar ali. É verdade que o botão às vezes liga automaticamente e a faz desligar do mundo sem querer. Mas aquela noite não foi automático. Ela realmente não queria estar ali. Não queria ouvi-lo, falar com ele, não queria estar ali. Uma parte dela estava morrendo de vontade de beijá-lo, mas era uma parte silenciosa dela. Uma parte sem forças. Então ela ficou ali, sem estar. Ele logo deduziu que o silêncio e distância dela eram por causa do cansaço. E tudo bem. Deixe que ele pense, por enquanto.

segunda-feira, 5 de março de 2012

I forgive you

I forgive you not because I love you, nor because I am afraid to lose you. I forgive you because I want to see where this will go. I want to see how further can we go, can I go. I have never been this far, this is all new. I don't really know how to handle this. How to handle your immature attitude, your selfishness, you. I am curious. Besides that, the guy that I fell in love with is bigger than all of those stupid actions. He is special, and he is still you.

O fim do mundo não vai cair do céu

Coisas tem caído do céu. Pedaços de satélites, lixo espacial. As chances de uma coisa dessas cair no nosso quintal são mínimas, quase inexistentes, mas mesmo assim elas caíram no quintal de pessoas do Maranhão na semana passada. "Assustada, a população chegou a falar em invasão alienígena e até em possíveis indícios do fim do mundo" a Folha de São Paulo relatou. O fim do mundo, minha gente, existe desde que o mundo se formou, lá atrás no Big Bang. O negócio é o seguinte: nenhum de nós vai estar aqui para vê-lo. Não se preocupem com coisas caindo do céu. As coisas que estão aqui na Terra são muito mais perigosas.

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

Muitos beijos, guaxinim

Eu reli o e-mail dele hoje. Um e-mail de dois mil e nove. Um e-mail que ele falava coisas contraditórias. E ele se despedia. Ele dizia que eu aprontava demais e ele não conseguia confiar em mim. Achei graça. Eu não gostava tanto dele assim. Eu sofri como uma louca, chorei dias sem parar. Não sei explicar direito por que, mas não foi porque eu o amava. Se eu o amasse, eu nunca teria feito nada do que eu fiz. Eu saía todos os dias, eu fazia planos sem ele, eu desaparecia. E quando ele desistiu, meu mundo pareceu acabar. Uma bobagem. Uma bobagem imensa. Eu deveria ter escutado a minha mãe, ela disse que aquilo iria passar, que eu logo esqueceria. Eu demorei um pouco para esquecer, mas passou. Aquele foi só mais um garoto que não me ensinou a namorar, que não me ensinou a amar. Ele ficaria impressionado se visse o quanto eu estou calma. O quanto eu estou em paz, fazendo todos os meus planos com alguém. Alguém que eu respeito e amo. Alguém que teve uma paciência imensa em me ensinar.

Desprezo

O seu silêncio me afasta. A sua falta de qualquer coisa também. Eu interpreto como um desprezo. Depois você vem e me esmaga entre os seus braços, me beija milhares de vezes, me olha com esse olhar apaixonado. Você vem, você fica, você pede, você me ama. Mesmo assim há um desprezo nos seus segredos. Na sua falta de vida além de nós dois. Onde está a sua alma que eu ainda não conheci? Eu não posso viver no meio da sua vida, sem saber o que há na sua vida, sem saber o que você pensa da vida.

A minha morte

Estou pensando em escrever um livro e já tenho dois enredos. Um deles é sobre a minha morte. No meio da sala, no meio do dia, no meio da vida. Assim, inesperada. Às vezes eu imagino a minha morte e não gosto de pensar nas pessoas que me amam. Meu pai, minha mãe, minhas irmãs, nelas eu não gosto de pensar. Gosto de pensar em pessoas que passaram na minha vida e se apegaram. Em pessoas que se importavam comigo e eu nem sabia. Eu gosto de pensar na cor das flores e nos meus lábios pálidos. Alguém vem e dá um beijo no meu cadáver frio. Lágrimas fazem a minha maquiagem escorrer, o que faz parecer que eu também choro. Mas eu não choro, eu não sei quem está ali, eu estou morta.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

A sua casa

Eu sempre fico angustiada quando eu entro. Mas eu gosto do cheiro da cozinha. É sempre o mesmo: de comida gostosa que foi guardada na geladeira. E eu sei que sempre tem mesmo alguma coisa parecida com a comida do restaurante mais fino da cidade. Manteiga caseira, torta de palmito e ricota e temperos especiais ou qualquer coisa do tipo. Eu gosto da cozinha. Eu gosto que sempre tem amêndoas. Eu gosto da cozinheira com voz de criança, tamanho de criança e jeitinho de criança. Mas ela cozinha como um chef francês. Mas aí a gente sai da cozinha e vem aquele eco de casa grande, aquele eco de vazio, aquele eco de um lugar que eu não pertenço. O quarto eu não sei. Ele é seu demais. É proibido tocar em tudo. Você não gosta que eu mexa. Você tem medo de ir tomar banho e me deixar mexendo. Mas eu não mexo. Tenho medo. Na primeira e última vez que eu mexi, encontrei um retrato seu com uma ex namorada. Vocês pareciam felizes. Ela era feia. E além de tudo tinha um recadinho seu pra ela, dela para você. Sei que você não jogou fora e eu não tenho a menor intenção de encontrá-lo no meio das suas coisas. Eu não quero encontrar nada na verdade. Eu não gosto de ficar sozinha enquanto você toma banho. Me dá agonia. Você disse que vai se mudar. Eu não quero que você se mude. Eu gosto da sua casa, ela só não é a minha.

Chorar flores

Eu queria que os meus cílios fossem maiores. E que às vezes fragmentos de flores caíssem sobre os meus olhos e ficassem presos nos cílios, até me fazerem lacrimejar.

domingo, 19 de fevereiro de 2012

Não diga isso

Suas lágrimas não são um desperdício. Nunca serão. Que bobagem é essa? Nunca mais diga isso. Seriam desperdício se ficassem guardadas dentro de você, sem poder drenar o seu pobre coração.

Domingo de carnaval

Eu vi a cidade vazia.
- Nenhuma alma à vista.
Me senti em um filme cult. Um filme sobre solidão, sobre silêncio.
Nessa overdose de fotos de praias e gente sorrindo,
talvez fosse bom um pouco de nada.
Você mais uma vez foi embora. E eu não quis saber por quê.
Nem insisti para que você ficasse.
Eu não sou assim.
Eu nunca vou te fazer ficar, a não ser que você queira.
Solidão às vezes é bom.
Bem às vezes, quando nada mais resta.

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Ela

Você vai ter que se acostumar com o fato de que eu sinto saudade. O tempo todo. Só de ficar em silêncio já me dá saudade, só de fechar os olhos, só de parar para pensar um pouco. Não estou falando de saudade de você. Estou falando de saudade de tudo. Eu não sei existir sem saudade.
Não saber o caminho é o mesmo que estar perdido?

Com amor, do Rio

Pensei que seria você a pessoa que iria me ensinar como é que funciona o amor à distância. Queria que você me mostrasse que é possível, que o amor por si só bastava, que não era tão complicado. Não deu. Não dá, não funciona. A gente pensa que ser romântico e acreditar já é o bastante. Na verdade, eu já sou um pouco desacreditada no amor, ele mesmo. O velho e simples amor. Eu ainda tenho medo de acordar e não ser mais amada pelo homem que eu amo. Ou de acordar e ver que isso tudo que estou investindo não é amor, não é amor o que eu sinto por ele. Os nossos pais não são um bom exemplo, você sabe. É conto de fadas demais, o caso deles é raro demais. Por isso fica difícil acreditar, quando se tem um conto de fadas em casa. Mas voltando ao amor à distância, se amar de perto já é difícil, de longe então... O investimento é muito mais alto, as expectativas dobram, tudo fica mais complicado. Mas eu queria, na verdade, aproveitar que a vida te deixou na mão para te falar uma coisa. Não foi você a pessoa que me mostrou que o amor à distância funciona. Mas é você a pessoa que mais me inspira a esquecer esse negócio de questionar, de ter medo, dúvidas. É você a pessoa que fica me mostrando que um coração quebrado se conserta, e logo volta a bater de novo. Logo volta a bater forte e rápido de novo. Até mesmo em menos de dezoito dias. "Ela achou que eu ia esperar dezoito dias, até parece. Em dezoito dias eu já estou curada" você me disse. Isso você me ensinou. E isso foi o bastante.

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2012

Iemanjá

Hoje é o seu dia, de novo. Parece que o seu dia foi ontem e não ano passado. Ai, minha santa, estou um pouco emotiva. Você tem feito tanto por mim... Ainda assim eu ainda preciso de tanto... Nada material, você sabe, preciso de outras coisas. Não posso falar aqui, eu ainda não sou forte o bastante para me expor assim, depois te conto em segredo, em uma rezinha só nossa. Você pode me ajudar? Desculpe minha santa, quase esqueci de te dar parabéns. Vou jogar uma flor no mar assim que eu chegar no Rio. É, eu vou para o Rio! Eu estava esperando o meu amor chegar para ir para lá. Mas isso é um segredo, tá? Iemanjá, vc parece tanto a minha mãe, sabia? Me sinto tão protegida no seu colo. Me sinto tão protegida com você ao meu lado. Sabe, minha santa, às vezes eu acho que você é a minha mãe. (É que ela é muito tímida, não diz pra ninguém que é você.)

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Sutileza

 Eu gosto das suas declarações sutis, entre uma frase e outra, escondidas no meio de um monte de outras coisas que você me diz. São por causa delas que eu fico um tempão sorrindo no trabalho. Quando você não diz nenhuma delas, as notícias que eu sou obrigada a escrever todos os dias me parecem tão inúteis. Quem precisa de notícias de outros lugares, quem precisa de informações de outras pessoas, dessas manchetes, quem precisa? Eu preciso das suas declarações, sutis ou não. Elas transformam o meu dia. Elas transformam tudo.

domingo, 29 de janeiro de 2012

Carnaval no vizinho

A janela do meu quarto dava para prédios, e nesses prédios sempre acontecia alguma festa. Eu era adolescente e ficava morrendo de inveja. Ficava me remoendo por dentro, ansiosa, triste, desejando estar naquelas festas. Eu sentia que era um fim de semana sendo desperdiçado. O tempo passou e eu fui à tantas festas, em tantos prédios, em tantos lugares que jamais conseguiria fazer as contas. Aquele sentimento bobo de antes passou. Claro. Eu já sei que não existem fins de semana desperdiçados. Quando ouço festas do meu quarto, me dá é preguiça de estar ali. Mas eu nunca perdi um carnaval sequer. Pulei todos. De formas diferentes em lugares diferentes, mas sempre pulei. Dessa vez eu vou trabalhar. Eu nem me importaria se não fosse por você. Pensar que você com os seus amigos fica tão diferente me incomoda. Que aquele seu amigo em especial vai estar junto me incomoda. Pensar que carnaval é carnaval e você vai estar por aí me incomoda. Se você não existisse, seria apenas mais um barulho de festa no vizinho. Mas você existe, a festa está alta, tem muita gente ali, e o fim de semana está sendo desperdiçado. 
Valeu a pena ter voltado por causa de mim?

Eu não quero mais isso

Você adora discordar de mim e eu ainda não entendo por que faz isso. Magoada eu não fico, mas desgasta nós dois. E desgastar não é o que acontece com os seus argumentos. Tantas vezes eu já concordei com você porque eu prefiro continuar de mãos dadas. Você não faz isso, mas eu quero te ensinar. Eu quero te ensinar que nós vamos discordar de tantas coisas, mas alguns momentos você vai ter que ceder, porque é isso que as pessoas que se amam fazem. Elas não concordam com tudo, mas não ficam discordando o tempo todo. Minha mãe tantas vezes concordou com o meu pai para evitar o desgaste. E vice-versa. Eu vejo isso o tempo todo. Vamos brigar pelas coisas que valem a pena, vamos discordar do que vai nos fazer aprender alguma coisa. Vamos prezar pela paz, porque ela é muito mais importante do que você tentar me provar que eu estou errada. Eu não quero mais isso. Hoje eu me dei conta que eu não quero mais isso.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

ERRATA

Ao contrário do que foi publicado qualquer dia desses por aqui, eu nunca fui quem eu sou. Eu sou, na verdade, quem eu nunca fui.

Ainda não voltou

Às vezes eu chego a acreditar em amor à distância, quando esqueço que nós moramos tão perto e que você já está voltando. A verdade é que você não parece morar ali e parece que, desde a primeira vez que você saiu, ainda não voltou.

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Eu não esperei

Não se preocupe porque eu não esperei por você. Talvez você tenha ficado sem graça de me dizer que não estava voltando, porque eu poderia estar te esperando. Mas saiba, eu não te espero mais. Já faz um tempo que eu aprendi a não ter expectativas, não esperar nada, não te esperar. Aquela vez, quando você saiu mais cedo da cama e ficou horas na cozinha, eu pensei que você voltaria com café na cama pra mim, como eu fiz uma vez pra você. (Lembra? Foi um desastre: o omelete estava sem sal, a torrada muito tostada e o café, frio.) Você não, você voltou da cozinha sem nada. E aquela foi a última vez que eu esperei alguma coisa de você. Hoje você diz que vem, diz que vai, diz que sim. Mas eu sei que não, não, não. O sim eventual me surpreende. Raras vezes me surpreende. Raras e maravilhosas vezes. Mas não se preocupe meu amor, eu aprendi a não esperar. Eu aprendi a deixar surpreender.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

Lancôme

As minhas mãos estavam secas, ásperas. Eu odeio quando as minhas mãos ficam assim. Procurei na minha bolsa algum creme, eu sempre tenho algum na bolsa. Não achei. Fiquei chateada. De pensar que eu ia passar o dia todo com as mãos secas, me deu vontade de chorar. Tudo já estava meio errado, desde o momento em que eu acordei mais cedo do que deveria. Acordei de mais um pesadelo onde eu ia embora. Ou era você que ia? Nem sei. Abri a bolsa de novo, procurei nos bolsos de fora. Achei. Nem vi que creme era, se era mesmo um creme, já fui passando. O cheiro era tão bom, que creme é esse, que eu lembro desse cheirinho de algum lugar? Esse cheiro me remete a alguma lembrança boa que eu não tenho certeza... Ah. Lembrei. Nós estavamos sentados na cadeira da penteadeira. Olhávamos as fotos pelo seu computador. Estavam lindas, as fotos. Mas já era tarde, estava na hora de dormir. Você fechou o computador e eu saí do seu colo. Você virou para me dar um beijo e eu reparei como o seu rosto estava seco, quase descascava. Na Itália fazia frio, e no Brasil, calor. Por isso a sua pele ficou assim, só fazia quatro dias que você tinha chegado. Eu propus te emprestar um creme, você não quis.
Mas eu insisti e você acabou cedendo. Enquanto eu passava aquele creminho de amostra grátis no seu rosto eu fiquei reparando nas suas pintinhas, e no seu olhão arregalado. Virou hábito naquela viagem o seu rosto ficar seco e eu passar aquele creminho. Era bom. Eu adorava aquela hora do dia. Eu guardei o frasquinho para comprar o creme um dia e te dar... Um dia. Um dia que nunca veio. O frasquinho que ficou guardado e hoje eu achei na minha bolsa. Eu já estava com vontade de chorar mesmo, não segurei. Onde é que ficou aquela viagem? Aquele você daquela viagem? Aquela eu tão distraída e orgulhosa de qualquer coisa? Minhas mãos não estavam mais secas, mas agora era o vazio que me incomodava. O vazio de hoje. Mas para esse, não tem creme. Não tem nada.

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Just a work night

Estou viciada em uma música que você nunca ouviu, e você nem imagina.
Ela é triste e fala de separação. Eu gosto de músicas tristes.
Não gosto de pensar que alguns detalhes tão insignificamente importantes para mim você nem sabe.
And now I'm giving up on you, plim plim plim (piano)
Penso em você dormindo com a boca ligeiramente aberta e os braços jogados (eu não estou entre eles).
A música acaba e a gente continua longe,
claro. Você dorme e eu estou plenamente acordada.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

terça-feira, 10 de janeiro de 2012

Eu já amo demais

Você fica me observando o tempo todo, e todos os dias e tenta me agradar de alguma forma.Vê o que eu gosto de comer, o que eu gosto de ler na internet, o que eu costumo fazer quando o trabalho acaba. Eu percebi, mas me faço de tonta e disfarço com uma falsa concentração na tela do computador. A última música que você pediu para eu escutar tinha uma mensagem secreta e eu não posso escutá-la. E nem quero.

Não ser mais outra

De repente eu não quis mais ser ruiva. Nem ter olhos claros e nem ser mais magra. Eu me dei conta que eu sou assim porque eu sou um pouco do meu pai, aquele que pulou mais de dez vezes de paraquedas. Aquele que faz até o jardineiro morrer de rir. Aquele que gosta de pintar ouvindo música clássica e quer ler todos os livros do mundo. O meu pai me emociona, e é incrível poder ter os traços dele.

Solitary dance

A minha pista de dança tem sido o meu quarto. Não que eu dance ali, mas eu não tenho dançado muito e quando danço é sozinha. Você bem que tenta vez ou outra. Acontece que eu ficaria a noite toda, e sei que você logo está cansado. Aí eu vou pro quarto e danço sozinha... Assim que eu fecho os olhos.

Um pequeno obrigada

Você me deu um pedaço do seu sanduíche e para a minha surpresa aceitou um pedaço do meu. Outro dia me falou sobre sua ex-mulher, e eu nem sabia que você já tinha casado. Eu fico feliz que você tenha me deixado olhar um pouco além da fresta. Você é uma pessoa incrível e eu precisava deixar registrado o quanto estou feliz em ter te conhecido.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Uma noite perdida

Aquela noite ele ficou jogando ping pong, e essa era mais uma das coisas que eu não sabia fazer. Fui para a praia, porque essa era uma das coisas que eu queria fazer com ele. Ele demorou para sentir a minha falta, e quando chegou lá, já era tarde. Eu não estava mais pensando nele. Eu pensava no trabalho. Eu agradecia aos meus colegas, e imagino que as energia que mandei para eles os fez dormir melhor, pelo menos aquela noite. Gosto de agradecer pessoas com uma certa reza. Quando ele chegou, ele estava bravo porque eu tinha sumido e nem percebeu como a lua estava grande, como eu estava bonita para ele e como eu daria tudo para viver naquela noite para sempre. E eu, bom, eu já estava com sono e queria dormir.
Eu não escuto mais nenhum voz que me faz escrever. Talvez elas não existam mais, ou talvez eu tenha perdido a caneta. Sinto falta deste blog, ele me deixava mais leve.

As suas coisas espalhadas

Elas me observam andar pela casa, chorar escrever  quando é minha vez de observá-las choro um pouco mais por tudo que carregam viagens, lemb...