segunda-feira, 23 de abril de 2012

Caixa de postais

Eu tinha medo dele, não sei por quê. Não sei se era porque ele morava sozinho, porque a família dele estava longe demais, ou porque ele tinha planos demais, concretos demais. Eu não tinha nada. Mal conseguia ver o dia seguinte. Eu tinha medo também porque ele queria me mostrar tudo, ele queria me ensinar tudo e eu não tinha nada para ensinar. Eu lembro quando ele pegou uma caixa enorme cheia de postais, fotos e papéis antigos. Lindos. Ele até me deu alguns dos mais bonitos. Eu lembro que fiquei encantada. Era um quarto pequeno, mas tão cheio de vida, de histórias, de conteúdo. Confortável. E eu cheia de medo de entrar na vida dele. Eu cheguei em casa e fui correndo montar um mural de fotos e postais. Queria deixar o meu quarto com vida. Com um pouco dele. Uma vez ele me levou ao último andar do prédio. A gente ficou olhando a cidade. Ele tinha duas tartarugas. Eu não lembro os nomes, mas lembro que ele gostava delas com um orgulho infantil. Ele não sabe, mas eu achava ele incrível. O problema é que eu sempre tive medo dele, até quando eu liguei uns dois anos depois. Continuava com medo. E foi o meu medo que disse aquele "até logo" fatal. Não fui eu.

2 comentários:

Anônimo disse...

Quisera "ser ele".

Felipe Sanches disse...

É o medo que separa. O medo de ser e de quem é só.

As suas coisas espalhadas

Elas me observam andar pela casa, chorar escrever  quando é minha vez de observá-las choro um pouco mais por tudo que carregam viagens, lemb...