segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

deu de ombros

a gata veio ver 
o que eu fazia
no escuro
me viu chorar:
deu de ombros.

Pode ser que melhorem

ele recitava poesia às vezes para mim
eu parava tudo para escutar
às vezes aos prantos
nunca mais escrevi as minhas também
nunca mais fiz desenhos para ele
esse foi um ano difícil 
eu desanimei muitas vezes
tenho saudades das poesias
acho que as coisas vão melhorar
talvez eu volte a desenhar
se ele recitar poesias para mim 
pode ser que as coisas melhorem

Sol

 não vou tomar sol hoje
o sol deixa a gente mais alegre
hoje eu não quero estar alegre
quero melancolia
quero escrever um pouco
depois eu tomo sol e apago tudo

caracol

tem um caracol comendo a minha planta
e tantas coisas comem as nossas coisas
e a gente come de tudo também
dei um peteleco no caracol
alguém precisa dar um basta.

casa preta

 Quando dou meu endereço eu escrevo:
(casa preta)
porque minha casa é toda preta
por dentro não
por dentro é cheia de tijolos e livros
e obras de arte e às vezes eu

três

Três e eu:
três cadeiras na mesa de jantar 
e a minha
três pratos de carne 
e o meu
tem dias que somos quatro
nos outros são três 
e eu.

Faca afiada

 Uma vez, aos sete ou oito anos de idade,
eu peguei uma faca de cozinha da minha mãe
bem afiada
levei até a sala, escura, e fiquei atrás do sofá pensando
que eu poderia fazer o que eu quisesse com aquela faca
depois de algumas horas
devolvi a faca para a cozinha e fui dormir. 

paixão

a paixão transtorna a vida da gente
faz a gente sair da nossa casa, tão gostosa a casa
cheia de coisas que gostamos, coisas nossas
e ir para a casa do outro
cheia de gente que a gente aceita
coisas que nunca escolheríamos
comidas que não gostamos 
depois a paixão passa e deixa a gente ali 
sem a nossa casa.

feliz natal

 você resolve as coisas 
o meu cérebro é tão mal resolvido 
dia sim dia não eu sofro 
por algo que eu poderia ter feito 
ou algo que poderia ter deixado para trás
me faz um favor
escreve outra cartinha 
aquela não tinha nada
eu nem sei o que quer dizer 
feliz natal

eu ajunto a coragem

eu só quero o que desejo porque  há o seu abraço o seu tempero o seu tempo, temperamento  há tempos eu percebo  minha vida, meu sossego  bem...