quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Distraída

Dizer que eu sou sua
que você é meu
é tão definitivo
e eu não quero dar motivo
para minha aflição
Tenho medo do futuro
o presente já é duro
quero apenas caminhar
distraída, sem notar
o meu entregue coração
pulsando na sua mão






domingo, 26 de novembro de 2017

Sonho

Me peguei sonhando
com os braços da sereia
que nada no braço
de um certo homem.

Domingo

É domingo, abro a janela,
busco uma caneta azul
(acho preto triste)
pego um caderno no chão
e escrevo.
É sempre domingo quando
escrevo sobre solidão.
Escrever me salva da tristeza,
do medo da semana que vem
(vem mesmo com medo),
da vida que anda passando,
como sempre com pressa.
Fico descalça, desnuda, sem nada no rosto
e na boca só o gosto
do bafo matinal.
Domingo eu me faço de morta, de tonta
não saio do quarto,
não vejo ninguém - se vejo não ouço.
Não gosto nem do espelho:
das marcas de noites passadas
em claro e às vezes com sorte
no peito de alguém.
No dia de hoje ninguém vem
o que fazia Deus no sétimo dia?
Eu no domingo
só quero morrer
e renascer
quando der.


quinta-feira, 23 de novembro de 2017

Poeta

Cabelos pretos grossos
cheios de fios brancos
um dente torto bem na frente
vinte e cinco tatuagens
ou talvez dezesseis
rugas ao lado dos olhos
que fazem o olhar sorrir
uma barba perfeitamente desenhada
com caneta de ponta fina
para detalhar melhor a alma
de menino curioso
de cozinheiro talentoso
de homem cheio de vontade
me dá saudade
ei poeta
você consegue se reconhecer
nessa poesia
feita para você?

domingo, 19 de novembro de 2017

Um homem partido ao meio

Você é agora feito de esforço
para se manter firme
cansado mas forte
com o som de pratos, talheres
cheiro de alecrim
sua presença tem dificuldade
de seguir sem o que tinha
e talvez não seja pouco
e talvez eu exija muito
de um homem partido ao meio.

Pressa

Me disseram que tenho pressa,
quero apressar o curso do rio.
Eu deveria esperar, ser mais calma,
deixá-lo passar no seu ritmo.

Não entendo que tipo de amor
esperam de mim.

Um amor calmo, que espera
sem nenhuma pressa de amar?

desconheço.

Desejo todo segundo de beijo
a cada segundo junto
- por que perder um segundo?

desperdício.

No pouco tempo
aqui que temos
eu quero amar
com pressa,
urgência,
falta de fôlego,
suor.
Se a dor vier
(ela sempre vem)
venha
e me pinte de preto
inteira.


sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Janela

Quando eu acordo, abro a janela
árvores, pássaros, fonte de água
um jardim emoldurado pra mim.

Tem gente que abre a janela
postes, prédios, muros
toda tristeza do mundo. 

Se há mesmo Deus,
peço que ele chegue também
à janela dos outros. 




domingo, 5 de novembro de 2017

ninguém

Quem sou eu
nesse mundo
que não é meu
O que eu faço
com tão pouco
que me foi dado
Para onde vou
se devo chegar
a lugar nenhum
Como vai ser
quando eu estiver
sozinho
Quando vai ser
meu dia de ser
alguém
Quem levo comigo
se todo mundo
já está ocupado
Por que, meu deus
somos todos assim:
ninguém

melhor

Eu tento todo dia
ser o que eu sei que é
o melhor de mim
com você aquele dia
enquanto eu era eu
e você me ouvia
eu nem me esforcei



segunda-feira, 30 de outubro de 2017

À noite

Sou muito mais da noite do que do dia.
De dia eu sofro pra fingir que gosto
do que não gosto,

Temos que nos enquadrar.

À noite é um silêncio:
só cigarras e grilos
e as teclas do meu computador,

Eu consigo me escutar.


terça-feira, 24 de outubro de 2017

Eu não lembrava de você

Eu não lembrava de você,
eu não queria lembrar de você,
mas você insistiu.
Algo no meu inconsciente,
algo que depois eu entendi o quê,
não me deixou registrar o nosso primeiro encontro.
Mas você insistiu.
Me fez convites que recusei,
fez piadas que eu ri
e uma hora eu finalmente cedi.
Subi na garupa da moto,
acendi a luz do teatro,
acendi o isqueiro no terraço,
e algo em mim se acendeu.
Numa noite de chuva eu quis dizer não.
Você insistiu, disse que éramos adultos,
que estava tudo bem.
Uma hora eu finalmente cedi.
Abri a porta do carro,
compramos um vinho,
contei-lhe um conto,
e como dois ímãs nos unimos.
Agora que tudo mudou,
que não somos mais ímãs,
que a cortina fechou,
agora eu me lembro de você.


domingo, 22 de outubro de 2017

solução

Hoje eu perdi o dia porque fiquei dançando no quarto.
Eu sofro por dentro e meu quarto está uma bagunça,
achei 
melhor 
dançar.

Unha

Vejo a minha unha roída
pequena, machucada.
Do conforto para esse abismo:
Eu aqui, atrás de sonhos,
distraidamente me ferindo.



Insane

why do I insist
isn't it insane to repeat
the same action
over
and over
and expect
a different result?

quinta-feira, 28 de setembro de 2017

fantasma de cigarra

Um dia eu vi meu pai caído no meio da sala. Eu logo percebi que era um corpo morto, a gente percebe quando um corpo não tem mais nada dentro. O meu tio disse que era para eu ficar quietinha e esperar. Eu fiquei quietinha atrás da escada, espiando os caras do IML jogarem o corpo do meu pai numa gaveta gigante. Foi assustador. Naquele instante eu tive uma visão. Eu vi o quanto o nosso corpo não é nada. Meu pai não estava mais ali, meu pai não era aquele corpo naquela gaveta. Meu pai já tinha ido embora, estava em outro lugar, em outra dimensão. Aquele corpo na gaveta era só mais uma casca sendo jogada fora. Lembrei de como as cigarras trocam de pele e largam uma casca pregada na árvore, como se fosse um fantasma de cigarra.

sábado, 23 de setembro de 2017

A depressão é uma forma meio misteriosa que a morte encontrou de se infiltrar em nós

não vem

Eu queria escrever sobre você
mas você não me deixa
você não vem me ver






Trilha de pedrinhas

Estou ouvindo um passarinho cantando lá fora. Esse som me lembra a minha infância, a minha casa de campo da infância. Eu andava descalça numa trilha de pedrinhas de um bosque que tinha lá. Meus pés doíam, mas eu me recusava a calçar qualquer coisa, queria que eles ficassem calejados para eu poder pisar em paz. Lembro de achar que aquele bosque era um mundo paralelo, o mundo paralelo de milhares de bichos misteriosos. Eu queria encontrá-los todos, ver como eles viviam. Era sempre assim: eu estava prestes a descobrir o segredo irrevelável dos pulgões, quando surgia uma voz do além: "Clarinha, vem comer!"

quinta-feira, 21 de setembro de 2017

quinta-feira, 31 de agosto de 2017

Pedaço

Se agora escrevo sobre você
é porque o pedaço seu que você me deixou
involuntariamente
infiltrou-se nos meus poros
transbordou no meu peito
transformou-se em palavras.
Se você nunca quis deixar nada pra mim,
peço desculpas.
Queria poder devolvê-lo,
mas agora é tarde demais:

ele está aqui.

Algo

Tantos anos se passaram e eu continuo não sendo nada.
Mas também, o que eu gostaria de ser?

Para o nada que eu sou,
até que tenho algo dentro de mim.


sábado, 26 de agosto de 2017

Fazia sol em Camburi

Fazia sol em Camburi e o céu estava completamente azul. Marcos era surfista e queria passar na casa da namorada de manhã para poder pegar umas ondas ainda antes do almoço. Ele estava cansado da namorada e queria terminar o namoro para poder surfar em paz. Estava numa época da vida em que tudo era uma descoberta: o surf, as garotas, as drogas, as festas e o céu azul de Camburi. Ele estudava, mas não muito. Queria crescer e ser alguém na vida, mas não muito. Ana odiava os "não muito" de Marcos e o namoro já estava péssimo há algum tempo. Ele estava decidido a terminar de forma rápida e indolor. Apesar de não acompanhá-lo nessa fase da vida, Ana era uma garota legal e iria entender, eles poderiam até se tornar amigos. Ele tocou a campainha daquela conhecida porta azul e ela abriu vestindo uma camisola escondida sob um roupão curto de seda - pela cara dela dava pra ver que já pressentia o término. Marcos respirou aliviado em pensar que tudo poderia ser até mais rápido do que ele planejava. Ele abriu a boca para dizer as primeiras palavras quando Ana disse: "estou grávida."

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

Viela, montanha, isolamento

Por que desviei?
Por que não observei,
por que não ouvi o seu chamado?

Em que viela, montanha, isolamento
eu estava?

Quando você aparecia (do nada),
quando você me alimentava (de poesia),
onde é que eu estava?

Por outro lado,
se vivemos num eterno retorno,
em que viela, montanha, isolamento
está você agora?


sexta-feira, 28 de julho de 2017

O assalto

Ontem eu vi um assalto, ou segundos depois de um assalto numa praça. Eram dez horas da noite e a praça me parecia bem iluminada. De um lado eu vi a vítima, um rapaz gordinho com uma camiseta amarela de ginástica colada no corpo e uma menina que não consegui perceber bem. O rapaz era moreno e tinha um cavanhaque. O bigode me chamou mais atenção do que a rala barba. Ele usava óculos de grau e capacete. Segurava a bicicleta com a mão direita e tinha o braço esquerdo jogado do lado do corpo no maior ar de derrota que eu já vi na frente. Ele fitava fixamente o assaltante indo embora e enfiando a carteira roubada no bolso. Do outro lado da minha visão tinha o assaltante. Ele passou perto do meu carro e eu achei que tinha visto uma arma no seu bolso. Tinha o corpo de no máximo vinte anos. Era magro, negro e vestia um moletom branco de gorrinho, com o gorrinho escondendo o rosto. Vestia um boné de aba reta também. Acho que estava de bermuda e chinelo, mas isso eu não tenho certeza se inventei, em todo caso a bermuda era preta. Aquela cena formou um quadro na minha memória cujo ponto central é a cara de impotência e fracasso do gordinho de bicicleta.

O Homem e Os Cachorros

(Baseado na pintura do Diógenes de Jean-León Gerome)

Aconteceu tão rápido e de forma tão misteriosa que eu nunca consegui entender direito aquele dia. Nós estávamos fugindo de um homem gordo que nos perseguia porque a gente tinha roubado carne do açougue dele. Corríamos apavorados, quase sem fôlego. De repente, eu tropecei numa estranha lamparina reluzente que estava no chão e machuquei a minha pata traseira. Todos os meus amigos viram o que aconteceu e pararam para latir. O homem gordo já tinha ficado quilômetros para trás. Com a pata sangrando, eu dei um coice na lamparina e reparei que ela se movia por conta própria. Dentro dela saiu uma faísca luminosa que em segundos entrou pela minha boca e me tomou por inteiro. Senti um fogo tomando conta de mim e uma sensação estranha misturada com enjôo, estafa e vontade de vomitar. Foi então que meu corpo começou a se transformar. Comecei a ficar cada vez maior, sem pelos, com pele de gente, braços, pernas. Meus amigos ficaram boquiabertos, sem conseguir nem uivar. Foi assim que no meio da praça, sem que nenhum ser humano notasse, eu, um pulguento cão vira-lata, me vi transformado num homem musculoso e barbudo. Sem nunca conseguir me adaptar a dieta humana e sentindo sempre vontade de cheirar o traseiro dos outros, passei o resto da vida tentando consertar a lamparina e desfazer aquele maldito feitiço.

sábado, 22 de julho de 2017

Cadáver

Hoje eu sou apenas um cadáver
com órgãos funcionando bem.
Quero encostar num banco de praça
e me deixar morrer.
Só que até isso exige uma força,
um adeus, alguma coisa
e eu não tenho mais nada.



sexta-feira, 7 de julho de 2017

terça-feira, 4 de julho de 2017

Quem sou 2.doc

Eu viro os olhos.
É a décima vez que escuto hoje:
- Claro, Clara.
As pessoas dizem isso e dão risada.

Para algumas pessoas
só à clara de ovo.
Para mim, Clara remete a luz,
a brilho, ao sol.

Sou clara de pele e de nome.
Estou sempre atrasada,
rôo as unhas e as tampas das canetas.

Ando depressa demais,
às vezes mais do que a mente:
não sou clara de pensamento.

Meu nome é Clara,
mas eu não sei dizer bem
clara de quê.

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Lixo

As pessoas acham poesia uma coisa tão babaca
sem propósito
lixo

Eu faço poesia na minha cabeça
enquanto observo as pessoas

Enfio a mão no lixo
e encontro consolo
para minha solidão.


Eu sei

Você me colocou em cima de uma prancha
e me empurrou para o mar
com um sorriso no rosto, desses de foto 
caminhamos na areia
falamos de riqueza, de vida, de amor
todas as nossas coisas
cheiravam a mexerica
você fez poucas piadas 
mas em todas eu ri
eu gostava de olhar para você
e você olhava pra mim 
como se eu soubesse de alguma coisa
(talvez eu saiba)



terça-feira, 13 de junho de 2017

Ar

Eu li um poema sobre as partículas de ar que nos cercam e não consigo parar de pensar nelas. O poema falava sobre como coloridas e lindas e esquisitas elas podem ser. Trafegam por esse ar seres totalmente desconhecidos, quase como as criaturas que habitam a maior das profundezas do mais longínquo dos oceanos. Eu penso nisso o tempo todo agora. Fico imaginando como podem ser essas partículas de ar, o que fazem, se precisaria de uma luz super especial para vê-las. Agora eu também penso que elas talvez reagiram de alguma forma, talvez fizeram um desenho estranho no ar, quando nós dois nos conhecemos.

Trauma de infância

Ela chamava Lia. Era bem pequena e loira, tinha pernas compridas cor-de-rosa e um corpo todo mole. Eu adorava bater papo com ela - e ficar esticando o seu corpo. Falávamos de vários assuntos como, por exemplo, os garotos da escola. Eu ficava super decepcionada que ela nunca me respondia. Um dia eu cansei de falar sozinha e decidi que ia apelar para feitiçaria. Algo ia fazer a minha boneca misteriosamente falar. A primeira coisa que eu resolvi tentar foi pedir para a lua. À noite eu deixei a Lia do lado de fora da varanda, para que a lua tivesse privacidade ao fazer o encanto, e pedi sem muita conversa nem reza. Disse: "Lua, quebra esse galho pra mim, faz a Lia falar comigo, eu quero tanto!" e fui dormir. Quando eu acordei, a Lia estava sentada na janela me olhando de uma forma atrevida. Achei graça e fui buscá-la na janela. Perguntei alto pra mim mesma: "E aí, Lia, vai ou não vai falar?" Ela continuou muda e ficou me encarando até soltar: "Olha, querida, eu só falo com você se você parar de falar desse tal de Fabinho, não me interessa o que ele levou de lanche no recreio, porra!"

quinta-feira, 8 de junho de 2017

ímãs

Por que Deus não fez mais fácil:
pessoas como ímãs - uma para outra?

Isso assim é muito errado.

Se uma pessoa é um pedaço de ímã
a outra é um pedaço de madeira
imóvel, inalterado pelo ímã insistente
que acaba caído no chão.

domingo, 4 de junho de 2017

Ser o que é

Queria tanto que você viesse
e sentasse do meu lado
e fizesse o que quisesse.
Cada um ser o que é,
um do lado do outro.
- Pra mim o amor
é simples assim.

quarta-feira, 31 de maio de 2017

Alguém

Alguém me apresente logo para mim!
Tenho pressa de me conhecer
tenho pressa de saber quem sou.
Sempre fui tão outra
me negligenciei
sempre me desconheci.
Preciso me decifrar
me entender
me decodificar.
Me tire desse alguém
que não sou eu.
Alguém ande logo:
eu tenho pressa!
Alguém me acorde já:
eu preciso ser eu.

O não

Você disse que eu tive pressa.

Eu me apresso porque tenho medo,
me apresso porque fujo,
apresso porque não quero sentir nada.

Quero estar em movimento,
de partida,
adiantada:
antecipando o não.

Cílios

Seus cílios enormes e os seus dentes meio errados.
Você vai embora muito em breve e por isso eu te deixei entrar,
mas não se engane: eu gostei de você.

Eu quis que os seus cílios encostassem nos meus.

As pessoas

As pessoas me chamam de corajosa o tempo todo e eu só sinto medo.

domingo, 28 de maio de 2017

Em vão

Naquela noite eu decidi vestir minha camiseta branca com bolso, só que ela estava toda amassada. Eu nem cheguei a provar pra ver se ficava bem, já fui logo pegando o ferro. Me deu preguiça de procurar a tábua então eu passei a camiseta rapidinho na cama mesmo. Fui pro banheiro me maquiar, arrumei meu cabelo e quando fui olhar no espelho notei que a manga da camiseta continuava amassada. "Vou assim mesmo" - eu pensei. Mas não. Achei que seria melhor passar, o ferro já estava ali do lado. Peguei o ferro com a maior má vontade e nem quis tirar a blusa pra passar, era um amassadinho tão tolo. Foi então que eu encostei o ferro no meu braço. Urrei de dor. Estava sozinha, não sabia o que passar no queimado, não quis ligar pra ninguém para perguntar o que fazer. Pus água e só. Meu braço ardia quando eu olhei no espelho. A camiseta nem tinha ficado boa com a calça. Troquei por uma preta e saí. Foi assim que eu ganhei uma das maiores cicatrizes que eu tenho no corpo.

segunda-feira, 22 de maio de 2017

My name

You know my name
you know my name so well
you know the texture of my skin,
my freckles, where my hair comes from,
you know why I laugh,
and how I laugh
you know why I stay quiet.

You have heard my silence
so many times
You have seen me sin
with you

you know my name so well
but you do not call it.

domingo, 21 de maio de 2017

Da minha dor

Mais um dia acabou
e eu continuo aqui.
Sentada, sozinha, sem nada.

Uma dor invade o meu peito
- e uma necessidade de escrever.

Deixo aqui então um pedaço da minha dor.

Faça
bom
proveito.

Casulo

Estou cansada
de sair de fininho
e esperar
e não ter resposta

de achar que é e não ser
de suspirar para o abismo
de procurar o meu erro

- qual foi o meu erro?

Estou cansada de sentir
borboletas
virarem casulo.

Indicação

Atrás de uma comanda de bar cheia de anotações sobre lanches completos ou sem queijo eu anotei o nome de uma poeta brasileira. Uma indicação sua depois de tanta conversa. Quando você disse que gostava de poesia eu dei risada. Você não entendeu qual era a graça e perguntou se era engraçado gostar de poesia. Eu te expliquei que a minha risada era porque ninguém gostava de poesia e era o que eu mais gostava. Deve ser por isso que eu me sinto tão sozinha. Conversamos sob o olhar de um homem feio que queria flertar comigo. Conversamos enquanto você comia uma coxinha vegana de jaca. Conversamos enquanto esperávamos as pessoas irem embora. Hoje aquela comanda está em cima da minha mesa e eu acabei de ler um pouco do livro que você me indicou.

domingo, 14 de maio de 2017

Luz

A luz fraca do meu relógio de pulso
refletiu no seu casaco de couro preto
você nem percebeu,
mas era algo de mim em você.

O riso

Josué estava apaixonado, muito apaixonado. Queria casar com a Laura amanhã se pudesse, mas ela pediu calma. Demorou meses para conseguir convencê-la de apresentá-lo para os pais. Marcaram um jantar num restaurante fino e ele ficou o dia todo se preparando para fazer bonito. Leu todos os jornais do dia, separou suas melhores roupas e ensaiou frases de efeito. A família da Laura era muito rica e estava cheia de receios porque ele mal conseguia pagar as contas do mês, mas o Josué era um homem seguro e se orgulhava de ser batalhador. Tinha certeza que ia conseguir pelo menos trazer um riso para o jantar. Todos foram pontuais. Se apresentaram, falaram sobre banalidades para quebrar o gelo e o jantar foi fluindo. Lá pela terceira garrafa de vinho começaram a falar sobre gastronomia. Ele suava até as mãos de tanto esforço que estava fazendo para agradar. A mãe de Laura disse que seu prato preferido era "coq au vin" e ele perguntou do que se tratava. Ela se mostrou surpresa com a falta de conhecimento dele e foi logo dizendo: "é um prato tão conhecido! É frango ao molho de vinho!" Josué ficou constrangido e, antes que perguntassem qual era o seu prato preferido, fez disfarçadamente uma pesquisa no celular por debaixo da mesa. Quando o pai fez a pergunta, ele respondeu bem rápido: "écrasé de pomme de terre avec saucisse" todos se olharam e ninguém conhecia o prato. O pai perguntou então o que era e ele respondeu: "purê com salsicha." Josué conseguiu o riso que queria, pena que foi de constrangimento.

agora

Chamei Deus de canto
falei baixinho
'agora'
e vi no horizonte
minha vida começar

terça-feira, 9 de maio de 2017

Relato

Entre todas as coisas que aconteceram recentemente na minha vida, a mais importante, mais viva, mais linda, mais rara, mais esclarecedora foi conhecer o Livro do Desassossego. Eu, aos trinta anos de idade e trilhando um caminho cheio de incertezas, me vi segurando o Livro na mão dentro da livraria. Sentei-me num canto e de repente imergi no universo de todos os questionamentos que me fiz a vida toda. A minha ânsia em devorar esse livro é tanta que não quero me demorar mais neste relato.

sexta-feira, 5 de maio de 2017

Quando alguém

Parece que eu não consigo atingir ninguém.
Que não sou notada, esbarrada, encantada,
que talvez eu seja feita de vento
ou de nada. E então,
quando alguém me responde
com um oi, pode ser,
um aceno que seja,
quando alguém me reconhece,
me percebe,
quando alguém me vê
- suspiros -
eu olho de volta, curiosa
querendo saber
se então é mesmo verdade
que eu existo.

quarta-feira, 3 de maio de 2017

Sonho

Hoje eu me lembrei do último sonho que tive com você. Na verdade você nem aparece nele, mas eu podia sentir a sua presença. A nossa casa estava vazia, como nas fotos que eu tirei para mandar para a dona, e eu precisava garantir que tudo estava limpo antes de ir embora. Só tinha o sofá, a lareira e a mesa de centro, mas as revistas que ficavam na mesa tinham voado com o vento e caíram no chão. O sonho parecia muito com o meu verdadeiro último dia na casa, mas tinha um ar melancólico, essas revistas caídas me davam vontade de chorar. Era você. Você era o ar melancólico, a minha vontade de chorar.

quinta-feira, 27 de abril de 2017

O pijama azul, que eu nem sei se era azul

Ele me contou de um pijama que ele adorava usar quando criança. Eu imaginei um pijama azul de feltro desses que cobrem os pés, tipo um macacão com meias, e com pequenos foguetes desenhados. Imaginei ele pequeno, com cara de sapeca, dizendo para a mãe que queria ir ao shopping vestindo aquilo. Será que a mãe dele, lá no seu íntimo, quis dar risada e apertar aquela figurinha? Será que levou aquilo a sério? O que será que ela fez? Os cabelos dele, na minha criação, estavam bem bagunçados e os olhos brilhavam cheios de bondade, a mesma que ele ainda leva nos olhos. Adoro imaginar as pessoas quando eram crianças e achei engraçado ele me dar assim, quase de graça, tanto substrato para o meu deleite.

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Só assim

Todos os dias olho no espelho
e vejo o reflexo de mim.
Minha vista deve estar cansada de me ver,
todos os dias a mesma eu.
Tem vezes que aparece uma montanha
- no meio da testa, no nariz ou no queixo -
mas em geral a paisagem é sempre a mesma.
Essa velha eu.
Se um dia eu cansar de me ver,
(e talvez esse dia esteja chegando),
o que eu faço, meu deus?
Eu que não tenho outro rosto,
que não tenho outro jeito,
que não sei ser outra,
eu que sou só assim,
o que vou fazer?


terça-feira, 18 de abril de 2017

Sentidos

Eu vejo olhos me olhando à noite enquanto passo,
esperem que eu olhe de volta, que eu pare, que eu volte.
Eu não.

Prefiro ser parada pelo ouvido.
Fernando Pessoa me fez dar meia volta
quando eu saía de uma casa uma vez.

Meus olhos saem sempre tristes à noite,
já sabem que vou gastá-los em vão.
Enquanto meus ouvidos não forem saciados,
nem meus olhos, nem meus lábios
se satisfarão.


segunda-feira, 17 de abril de 2017

Pela primeira vez

Ontem eu vi algo pela primeira vez.
Estávamos todos na sala quando minha mãe disse que precisava trocar o bebê. Ela perguntou se eu sabia como se trocava um bebê. Eu disse que sabia, tinha visto minha irmã trocar a Manu, mas mesmo assim eu queria vê-la trocar e aprender mais uma vez. Subimos para o quarto, minha mãe pegou o protetor de cama, os apetrechos e lencinhos e as fraldas ecológicas da minha irmã. Puxamos os bracinhos da Manu, mexemos o bumbunzinho dela, limpamos toda a caca, mamãe me ensinou a checar todas as dobrinhas. A Manu deu risada, foi super boazinha e linda. Trocamos a blusa dela e a mamãe levou ela embora no colo. Aquele momento, ver minha mãe sendo avó com aquela delicadeza, aquele jeitinho dela, aquilo mexeu comigo como se eu visse o mar pela primeira vez.

Empresto de Hilda Hilst

Se te pareço noturna e imperfeita
Olha-me de novo. Porque esta noite 
Olhei-me a mim, como se tu me olhasses.
E era como se a água 
Desejasse

Escapar da sua casa que é o rio,
E deslizando apenas, nem tocar a margem.

Te olhei. E há tanto tempo 
Entendo que sou terra. Há tanto tempo 
Espero
Que o teu corpo de água mais fraterno
Se estenda sobre o meu. Pastor e nauta

Olha-me de novo. Com menos altivez.
E mais atento. 


(do "Dez chamamentos ao amigo")

sábado, 8 de abril de 2017

Despreocupados

Eu lembro direitinho da primeira vez que eu quis casar com você. A gente estava no Camboja, bem no meio da viagem, e o guia turístico esqueceu de nos avisar que ficaríamos dois dias sem banho. Aquela noite a gente ia dormir numa vila de palafita com uma família local. Eu vestia um macacão curto e uma regata laranja e você uma bermuda cáqui e uma camisa da seleção. Durante o dia, totalmente despreocupados, fizemos tudo que tinha para fazer: andamos de charrete de madrugada para ver o nascer do sol, comemos um escorpião e partes de uma tarântula, atravessamos uma ponte mística e suamos toda a água do nosso corpo. Meu cabelo, que era super comprido, estava duro por causa do suor. O sol já estava se pondo quando o guia lembrou de nos avisar sobre o banho. A gente já devia ter imaginado que isso fosse acontecer porque aquela vila ficava no meio do nada e não tinha eletricidade, internet ou álcool gel. Eles nem sequer conheciam essas coisas. A seleção brasileira de futebol eles conheciam. Logo que o guia terminou de falar eu imediatamente senti o meu próprio cheiro e quis chorar um pouquinho. Olhei para o lado e você não estava mais ali: estava jogando futebol com as crianças da vila.

terça-feira, 4 de abril de 2017

Sobre a velhice

Ando descobrindo muito sobre mim mesma nas coisas que escrevia sobre os outros nos meus diários. Outro dia eu li que estava de saco cheio de um certo namorado "velho de 29 anos" porque ele não gostava de guloseimas de supermercado. Eu escrevi que sempre amaria chocolates e salgadinhos de supermercado e que aquilo era velhice dele. Que triste. Hoje eu tenho 30 anos e detesto guloseimas de supermercado.

Nota sobre um namorado

Ele não soube me amar como um homem ama uma mulher, ele me amou como se ama um quadro na parede.

domingo, 2 de abril de 2017

Cacos (um poema antigo)

Três vidros quebraram na minha mão essa semana:
uma taça,
um pote,
uma janela.
Queria quebrar o vidro que te envolve.
- Ei, você me escuta agora?
E você, então, passaria a me ouvir.


quinta-feira, 23 de março de 2017

O Universo e o medo

Sempre que eu tenho medo, qualquer medo em qualquer situação, eu tento mentalizar o tamanho da Terra diante do Universo. O medo não some, mas ele fica proporcional a minha insignificância. 

segunda-feira, 20 de março de 2017

A alma do dente

No começo do ano eu precisei tratar o canal de um dente. É um processo dolorido, dá aflição, não é legal. Eu fiquei na sala de espera tentando entender como funcionaria, eu já tinha tratado canal outra vez mas fazia muito tempo e eu nunca perguntei como era. Quando o odontologista me chamou na sala, eu reparei que ele era um senhor de setenta e poucos anos, cheio de energia e até com um certo carinho. Ele pegou uma prótese gigante de um dente igual ao que eu iria tratar e começou a me explicar delicadamente como seria o processo. "Primeiro nós abrimos aqui, depois tiramos isso aqui. Imagina que o dente é um rio e que eu estou tirando toda a água do rio, todos os galhos, tudo. Se um dente tem alma, nós vamos extrair a alma do dente." Eu olhei pela janela do consultório e me lembrei de Sísifo. A especialidade daquele dentista é tratar canal. Todos os dias de cinco a dez pacientes vão no consultório dele para tirar a alma dos seus dentes infeccionados. Todos os dias ele pega uma prótese gigante do dente infeccionado e mostra para o paciente que o canal é como um rio. Sísifo foi condenado a levar uma pedra ao topo da montanha, mas toda vez quando chegava no topo a pedra rolava de volta para baixo. Depois de anos executando essa tarefa, provavelmente Sísifo entendeu que o que importava não era que a pedra fosse deixada no topo da montanha, mas como a pedra era levada: com mau humor, tristeza, resignação? Ou assobiando, cantando, batucando na pedra? Durante o meu procedimento, eu percebi que o meu dentista tratava canais com o cuidado que se tem ao lidar com uma alma, mesmo que de um dente. Todos os dias a pedra dele rolava de volta para o chão, mas dava pra ver que ele subia a montanha assobiando.

sábado, 18 de março de 2017

No último andar

Num domingo frio e cinza como hoje
ficaríamos os dois no último andar
com os pés gelados
e a janela aberta.
Você tentaria levantar,
mas eu te puxaria de volta.
Pensaríamos no dia, faríamos planos.
O dia, sem esperar que estivéssemos prontos,
iria passando sutilmente
pela janela do nosso quarto
no último andar.


terça-feira, 7 de março de 2017

Cinzas

Você já tentou pegar cinzas na mão? Não dá, elas se dissolvem nos dedos. Quando eu morrer, quero virar cinzas. Quero ser soprada no ar e virar vento. No máximo ser soprada no mar da Califórnia e virar onda para algum surfista pegar. Não quero ocupar espaço na Terra com um buraco e uma grande caixa de madeira. Para que guardar os meus ossos? Quem inventou isso de guardar ossos? Depois que a pessoa já virou vento, já foi embora para o Universo, por que guardar os seus ossos? Nosso planeta já está tão entulhado, tão saturado, tão dolorido. Quando eu morrer, quero ser cinzas.

sexta-feira, 3 de março de 2017

Sangue


Uma vez, quando eu tinha nove anos, o meu avô veio passar uns dias em casa. Eu não me lembro muito bem como foi essa estadia, mas me lembro que ele estava doente. Não lembro que doença ele tinha, mas lembro de vê-lo tossir muito. Uma vez, ele tinha acabado de sair do banheiro e eu entrei para buscar alguma coisa quando vi sangue no tapete e no chão. Eram pequenas gotas, algumas eram marrom. Fui dormir com um certo medo ou algum sentimento que eu não soube identificar. Uns dias depois, talvez semanas ou meses, eu acordei no meio da noite para ir ao banheiro. Olhei para baixo e vi a minha calcinha com uma mancha de sangue. Era uma mancha marrom igual ao sangue do meu avô. Entrei em pânico, pensei em morte e fui dormir achando que eu estava com a doença do vovô.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

After Rio

When in doubt, relax
when in doubt, take a deep breath
when in doubt, try to smile
when in doubt, stay patient
when in doubt, observe.
Observe how life has its own tricky ways to make things always work out. Observe that we are constantly changing with every tiny bit of information we receive. Observe how every single person in this Planet has their own struggle we know nothing about. Observe that each one of us is part of one single beautiful thing (maybe a miracle!) called life.

Os gatos

You use a lot the word "cat", he said. As I wonder he explained: cat is how you call those electricity wires that bring light to the favela. Cat is when you fix something with a material that wasn't meant for that. Cats are stamped in clothes, is the way you call a handsome guy. What is it that Brazilians have with cats?

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2017

Dias ruins

Teve uma vez que você disse: "a casa é minha!". Fiquei horrorizada. Na verdade, eu sempre soube que a casa era nossa e nunca questionei isso - nem mesmo aquele dia. Só não gostei de ter ouvido de você e por isso não dormi em casa aquele dia. Eu sempre soube que o seu amor não estava nas suas palavras. Você me esmagava tanto. Nunca aceitava que eu dormisse sem estar devidamente aninhada no seu peito. Você perguntava do meu dia, me contava do seu, fazia comentários, perguntas. Você cuidava de mim. Eu sei do seu amor, meu amor. Eu sei que éramos casados. Eu sei que você me amou como soube. Os dias ruins - em todo esse tempo - foram dois. Esse que você disse que a casa era sua foi um. O outro foi quando os seus pais chegaram, bem vestidos, cheirosos, animados. Seu pai estava com um tênis novo, elegante como sempre. Sua mãe, impecável em um vestido creme e jóias. Eu vestia uma roupa de fazer ginástica e estava terminando de limpar a cozinha. Você, terminando de juntar os seus documentos. Abri a porta, cumprimentei os dois, comentei sobre o quanto eu tinha gostado do seu corte de cabelo, eles deram risada, nos abraçamos. A sua mãe entrou na nossa casa e disse: "vamos, filho?" e os dois te levaram para o aeroporto.

domingo, 5 de fevereiro de 2017

No bonde

Não é todo mundo que tem coragem de se perguntar: "é isso?"
Eu tive. E não era.
Tirei o meu cinto, me levantei da cadeira e saí.
O bonde andando
me joguei pela janela.
Recobrei a consciência horas depois no meio do mato.
Me levantei e descobri que estava sozinha
no meio
do nada.


quinta-feira, 2 de fevereiro de 2017

sinal

Quando você me der um pedaço de alguma coisa
quando você me der alguma coisa
quando você me der oi
quando você vier
se você vier
se você souber aonde vir
se você existir
me mande um sinal

Só não me resolva

Eu uso as suas camisas,
vejo as nossas séries,
como tudo que você gosta,
mas eu passo longe
das suas fotografias.

Não posso ver o seu rosto
porque esse rosto é também um abraço
e um corpo que eu conheço tão bem.

Ouvir a sua voz eu posso,
a sua voz está longe,
a sua voz é feita de ondas sonoras
- e não de você.

Eu vivo bem aqui, sem você,
só não me resolva aparecer.


quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

Trinta

Estar aqui, sem emprego, namorado, noivo, marido, companheiro, filho, dinheiro, profissão, carreira, casa, poupança, perspectiva a curto prazo - ou a longo - mas estar aqui, firme.

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

A seguir

A loira de cabelos curtos me falou que eu tenho medo de alguém me desviar do meu sonho. Sonho, palavra tão caipira! Se alguém me desviar, que seja doce. Que seja belo, que seja bom. Que me desvie! Só me largue depois de um tempo: tenho um caminho a seguir.

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

A nossa casa

Eu lembro da lareira nos dias de frio, do regador regando o passarinho no verão. Eu lembro das pizzas caseiras e da única vez que você fez sushi. Do dia dos namorados, quando você fez purê com salsicha à luz de velas e escreveu um cardápio em francês. Eu lembro das noites de filme, de vinho, de ensaio para a sua apresentação. Tiveram as noites que você dormiu no sofá, que a gente não se viu, que dormimos separados, mas todas essas eram exceções. A regra era eu e você entrelaçados. Teve a festa surpresa que sujou o chão por semanas, a festa de carnaval, a abertura da Olimpíada. A nossa casa tinha vida, tinha plantas por todos os lados, tinha luz, jardim, tinha obras de arte. A nossa casa tinha humor, jornal, gastronomia, água de coco, passeios de bike. A nossa casa tinha amor. Tinha eu e você, o que mais precisava ter?

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Estrofe

Na fumaça que eu exalo tem um pouco de morte,
mas eu gosto.
Enquanto você é o oposto,
eu danço.
Acontece, meu amor, que a vida só não me basta,
e eu logo me canso.

segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Maybe

I'm scared but curious,
I'm scared but willing,
I'm scared but I have a good feeling,
maybe I'm not scared,
maybe I'm excited.

sábado, 14 de janeiro de 2017

No carnaval

O carnaval está chegando
mais um carnaval
e eu não estou disposta.

Perdi a vontade no ano novo
quando tudo recomeçou
e eu não estou pronta.

Não quero ouvir as marchas
as danças, as pessoas se amando
no carnaval.

Esse ano eu não sei quem sou
- mais uma vez -
e preciso me encontrar.

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Risco

Será que essa distância foi feita para me deixar
tentar o mundo sozinha, ver se eu sou capaz,
me fazer andar com minhas próprias pernas
uma vez na vida?

Será que vai dar tempo de desfazer o nó?
Quando eu voltar, vencida na vida,
sorrindo, completa, será que vai dar tempo
de te encontrar?

Sem

Essa noite eu estou aqui, sem você,
ouvindo uma música que você gosta.
Eu poderia estar entrelaçada no seu peito,
sentindo a sua respiração como eu gostava de fazer,
mas eu estou aqui - nesse quarto sitiado -
pensando no seu cheiro,
imaginando o seu carinho,
naquela cama pequena,
naquele quarto no último andar.


quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Vovó

A vovó me mostrou que os mosquitos adoram pousar nela. Me mostrou como as uvas amadurecem e me mostrou quando dá pra colher ou é melhor esperar. Ela me mostrou as pitangas boas, mas não quis provar nenhuma. Pegamos manga, até algumas com bichinhos, e castanhas. Demoramos umas boas horas entre dar comida ao passarinhos, olhar o jardim e colher as frutas. Fomos vendo as minhocas, as plantas que cresceram, o portão que ficou aberto. A vovó é um barato! Faz piada atrás de piada, esquece e lembra, pergunta e dá risada. Vovó viveu tanta coisa, teve tantas vidas numa só. Agora ela tá tranquilona, regando as plantinhas, colhendo frutas, vendo os passarinhos e assistindo tevê. Adora receber visitas e adora mais ainda quando a visita aceita tomar um cafezinho. Vó, acho que os mosquitos pousam na senhora porque o seu sangue é docinho, docinho.

sábado, 7 de janeiro de 2017

História de amor

Eu vivi uma história de amor.
Teve frio na barriga,
coisa do destino,
viagem pro outro lado do mundo.
Teve fogos de artifício,
biribinha,
Ibiúna.
Teve refúgio no mar,
festa na praia,
no campo,
na cama.
Na minha história de amor
teve príncipe de cavalo branco
sem o cavalo,
mas ele era um príncipe
- o meu.
Na minha festa de amor,
teve muita história,
coincidências,
tosse, falta de ar, lençol rasgado.
Teve o bafo da manhã,
amor de manhã,
sempre amor.
Teve casa com jardim,
jardinagem,
rede de deitar.
Teve muitos pássaros
e um em especial.
Teve lua de mel várias vezes,
mel e geléia,
pizza caseira.
Teve piadinhas, tantas piadinhas,
gargalhadas.
Teve palavrão,
palavrinha
e silêncio.
Teve doença e saúde,
triatlon,
cinema no domingo.
A minha história de amor
filme nenhum chega perto:
foi real de carne e osso.
Foi conto de fadas,
amor dos sonhos.
Eu fui cinderella, bela adormecida,
rapunzel e branca de neve.
Ele me salvou da minha vida,
e me deu a dele.
Nos amamos como se pode amar
tanto, tanto, tanto.
Dá vontade de chorar
e alegria de pensar.
De tudo que ele me deu,
a coisa mais linda
foi toda a poesia que a gente viveu.


sexta-feira, 6 de janeiro de 2017

Pronta

Quando todo mundo me pergunta
se estou pronta:
Não.

Eu acabei de chegar,
eu preciso aprender,
eu não.

Não tenho nada certo na cabeça,
morro de medo de tudo
não não não.

Não adianta explicar
para quê:
Não estou pronta para nada.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2017

A onda

Eu voltei, mas tive que deixar uma mala de coisas lá. Uma parte de mim também ficou dentro daquela mala. Uma parte de mim que não se sentia pronta, que tinha medo, que deixava a onda sempre me levar. O restante de mim que voltou nunca mais vai deixar onda nenhuma me levar. Agora eu quero é ser a onda.

As suas coisas espalhadas

Elas me observam andar pela casa, chorar escrever  quando é minha vez de observá-las choro um pouco mais por tudo que carregam viagens, lemb...