O cimento da parede da nossa casa separa o nosso corpo.
Seu corpo de cimento, o meu de parede - e a casa vazia.
A casa faz eco no meu peito de pedra.
A casa faz eco no seu peito sem nada.
Eu na sala, ele no quarto e a casa sem ninguém.
- Onde estão os moradores desta casa? - pergunta alguém.
- Não estão aqui. - respondem as paredes.
É que as paredes nem sabem mais dos moradores:
paredes, passos, camas, nada, ninguém.
Uma coisa na casa faz barulho,
uma coisa na casa parece ter vida:
a janela aberta cheia de vento.
sexta-feira, 29 de maio de 2015
Tem sim
O pouco que me restou foi isso:
rimar sim com fim.
Tem coisa mais clichê,
mais vazia,
mais infantil que rimar sim, mim, fim?
Tem, tem sim.
Não rimar nada e deixar a vida passar.
rimar sim com fim.
Tem coisa mais clichê,
mais vazia,
mais infantil que rimar sim, mim, fim?
Tem, tem sim.
Não rimar nada e deixar a vida passar.
sexta-feira, 15 de maio de 2015
Auto-censura
Dentro de mim cabe tanta coisa, tanta gente, tanto desejo.
Dentro dessa casca aqui que alguém fez.
Ou será que não, ou será que ninguém fez?
Tenho dores nas costas,
rinites fortes,
fortes preguiças de dar bom dia.
Gosto de ser amada,
mais do que amar.
Mas isso não sou eu que digo,
é o meu psicanalista.
Tenho medo de viver,
mais do que de morrer
- e isso me derruba às vezes,
mas eu seguro firme.
Dentro dessa casca aqui que alguém fez.
Ou será que não, ou será que ninguém fez?
Tenho dores nas costas,
rinites fortes,
fortes preguiças de dar bom dia.
Gosto de ser amada,
mais do que amar.
Mas isso não sou eu que digo,
é o meu psicanalista.
Tenho medo de viver,
mais do que de morrer
- e isso me derruba às vezes,
mas eu seguro firme.
Escrivaninha
Estou sentada na sua cadeira.
Eu me sento como se fosse você,
digito no computador do seu jeito
e ignoro completamente o resto do quarto
- como você faz quando senta nessa cadeira.
Eu me sento como se fosse você,
digito no computador do seu jeito
e ignoro completamente o resto do quarto
- como você faz quando senta nessa cadeira.
sexta-feira, 8 de maio de 2015
Ida
Assisti um filme que acho que você vai gostar. Apesar de ser em preto e branco, e ser polonês, e ser bem devagar e silencioso, e também ser cheio de enquadramentos diferentes, apesar disso ele é cheio de referências lineares hollywoodianas. Por exemplo: a história começa de um jeito, até que de repente um problema é apresentado. Então, a protagonista parte numa aventura (como em "O Mágico de Oz") para encontrar respostas, conhecer a si mesma e aprender um monte de lições. A protagonista então vive um ápice, (ou de alegria ou de tristeza. Neste caso, acho que foi uma alegria aquele rapaz moreno de cabelos curtos, saxofonista em uma banda de jazz.) e tem que tomar uma decisão. A tomada de decisão não é fácil e acompanha um rompimento. Mas existe uma pessoa que vai acompanhar essa jornada e ajudá-la por algum motivo. Foi assim também em "A Vida Secreta de Walter Mitty", que tanto agradou todo mundo - inclusive nós dois. Neste filme - Ida - tudo isso é feito de um jeito lindo, poético, doce. A protagonista parece um lindo retrato antigo. Os silêncios deste filme são mais importantes que qualquer palavra. E os silêncios aqui acabam vencendo por fim. Além disso tudo, esse filme ainda me apresentou muito bem apresentado a John Coltrane - e jazz não é um estilo de música que agrada todo mundo. Fico tão feliz que agrade você também. Acho que terei que assistir esse filme de novo com você. Tudo bem, com você eu assisto.
quinta-feira, 7 de maio de 2015
Para minha irmã
Eu te apoio porque em parte eu queria estar no seu lugar.
Viver um amor tão bom longe de casa,
longe do ninho, perto de você mesma.
Longe é bom pra se conhecer.
Longe é bom para ver tudo de longe e dizer: "quero estar aqui."
E aqui pode ser lá - ou aqui.
Essa casa
Eu e você
quanto tempo
há quanto tempo que somos
eu e você?
Nossa casa
toda nossa
há quanto tempo que é nossa
essa casa?
Não faz tanto tempo,
parece que foi ontem
- e quase foi
pra quem ainda tem uma vida toda.
Mente mente
Eu tenho dúvidas se eu me conheço de verdade, se eu sou eu mesma. Quero coisas que eu, se pudesse escolher, não quereria. Seria mais em paz comigo mesma, teria outras neuroses. E como é que eu não posso ser como eu queria? Não sou eu mesma que mando em mim? Não sou eu mesma que digo pela mente: "mexam-se braços!" e eles se mexem? Por que não posso dizer pela mente: "seja assim! Goste disso!", por que não? Eu sendo assim, tão não eu - ou como eu gostaria de ser, eu me sinto distante, muito distante.
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