terça-feira, 26 de março de 2013

Marina e Ulay

Ele sentou na cadeira. Ela olhou, olhou, e na verdade não demorou muito para que seus olhos lacrimejassem. Ela não deveria, mas esticou as mãos, precisava tocar nele, mesmo que fosse uma pequena transgressão. Foram muitos aplausos, mas ela não os escutou. Ele também não. Ela olhou para ele com mais atenção do que para qualquer uma das seis mil pessoas que sentaram naquela cadeira nos últimos tempos. Reparou em absolutamente todos os detalhes da sua face. Como envelheceu, ela pensou, mas como está bonito. Ela lembrou das discussões filosóficas que tiveram dentro daquele furgão velho, lembrou da quantidade de vezes que fizeram amor, do quanto ele a implorou para que parasse um pouco de fazer arte para que pudessem viver juntos no Nepal. Ela sempre recusava. Eu sou artista, está no meu sangue, dizia. Ela lembrou do quanto ele a fazia criar obras mais profundas do que normalmente, mas que um dia tudo ruiu. Essa questão do espaço, que eles já não tinham mais. Era difícil conviver tanto tempo em tão pouco espaço. As discussões viraram brigas e ele resolveu partir. Foi consensual, ela também topou. A coisa estava desgastante demais, não dava mesmo. Então eles se despediram como dois adolescentes e nunca mais se viram, até aquele dia. Fazia 12, 13, talvez 14 anos. Ele estava agora a alguns palmos de distância dela. E ela precisou mesmo transgredir a obra e pegar nas mãos dele. As mãos frias do homem que mais amou. Então ela soltou as mãos dele e enxugou as lágrimas. Ele ficou ali, paralisado alguns segundos, esperando alguma coisa. Nada. Foi só um encontro. E foi embora.

Um comentário:

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