quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

Vigésimo segundo andar

Tenho medo de chegar, e ser tudo escuro demais.
De fazer aquele eco que as salas vazias fazem.
De subir rápido demais as escadas, e ficar sem fôlego para dizer oi.
Tenho medo, muito medo de não haver nenhum vaso de flor.
É possível que o sofá seja alto demais e eu não consiga me sentar.
É possível também que eu pise forte demais no chão e os vizinhos de baixo reclamem.
E se o elevador parar? E se a janela não abrir?
E se eu estiver com medo de não saber mais te amar?

4 comentários:

Anônimo disse...

Dê a chance de amar, para depois saber ou não saber, amar!

M...

Felipe Sanches disse...

Medo
(Carlos Drummond de Andrade)

Em verdade temos medo.
Nascemos escuro.
As existências são poucas:
Carteiro, ditador, soldado.
Nosso destino, incompleto.

E fomos educados para o medo.
Cheiramos flores de medo.
Vestimos panos de medo.
De medo, vermelhos rios
vadeamos.

Somos apenas uns homens
e a natureza traiu-nos.
Há as árvores, as fábricas,
Doenças galopantes, fomes.

Refugiamo-nos no amor,
este célebre sentimento,
e o amor faltou: chovia,
ventava, fazia frio em São Paulo.

Fazia frio em São Paulo…
Nevava.
O medo, com sua capa,
nos dissimula e nos berça.

Fiquei com medo de ti,
meu companheiro moreno,
De nós, de vós: e de tudo.
Estou com medo da honra.

Assim nos criam burgueses,
Nosso caminho: traçado.
Por que morrer em conjunto?
E se todos nós vivêssemos?

Vem, harmonia do medo,
vem, ó terror das estradas,
susto na noite, receio
de águas poluídas. Muletas

do homem só. Ajudai-nos,
lentos poderes do láudano.
Até a canção medrosa
se parte, se transe e cala-se.

Faremos casas de medo,
duros tijolos de medo,
medrosos caules, repuxos,
ruas só de medo e calma.

E com asas de prudência,
com resplendores covardes,
atingiremos o cimo
de nossa cauta subida.

O medo, com sua física,
tanto produz: carcereiros,
edifícios, escritores,
este poema; outras vidas.

Tenhamos o maior pavor,
Os mais velhos compreendem.
O medo cristalizou-os.
Estátuas sábias, adeus.

Adeus: vamos para a frente,
recuando de olhos acesos.
Nossos filhos tão felizes…
Fiéis herdeiros do medo,

eles povoam a cidade.
Depois da cidade, o mundo.
Depois do mundo, as estrelas,
dançando o baile do medo.

Priscila Rôde disse...

Se tens medo de não mais amar, é por que ama.

Beijos.

thais m. disse...

Acho que a gente sempre sabe amar!

uma mordida na perna um veneno de lagarta no dedo uma conta negativa no banco uma franja que eu não gosto um bloqueio criativo um medo que n...