segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Beijo de poeta

Eu vou contar essa história, porque ela tem perseguido os meus pensamentos. Eu vou contar essa história também porque ontem eu estava no carro com você, e os seus pensamentos gritavam para eu fazer silêncio, por isso eu pensei no passado. Eu não sei quantos anos eu tinha, mas era menos de dezoito. Ele deve ter uns cinco anos a mais que eu. Seis talvez. Não sei como nós nos conhecemos, mas ele tinha um certo fascínio por mim. Eu contava tudo pra ele. As minhas dúvidas, as minhas poesias, os meus medos, as minhas coragens... Ele ouvia tudo com uma atenção que me dava coragem. E me ensinava tanta coisa... Falava de filosofia, de cinema, de livros... Tinha tudo para eu me apaixonar. Mas eu era muito nova, muito imatura, muito me faltava. E eu não me apaixonei. Ele sim. Ele me ligava, me convidava, queria me ouvir. Eu tinha um diário que eu até hoje acho lindo. Escrevia coisas lindas nele. O garoto pediu o meu diário, e disse que já devolveria. Eu o emprestei, porque confiava tanto naquele sorriso infinito... Eis que em uma das páginas eu escrevi que ele tinha beijo de poeta. Sim, claro, porque nós nos beijamos certa vez. Ele ficou encantado em saber que tinha beijo de poeta. Nesse ínterim, eu sumi. Fui para festas, almoços, churrascos, viagens, e sumi para ele. Ele também parou de ler o meu diário. E parou de me achar fascinante, porque descobriu uma outra garota. E como era de costume, ele me ligou. Eu a encontrei, ele me disse. A mulher da minha vida, a encontrei. Ela é incrível. É inteligente, fala coisas incríveis, entende de poesia, cinema, música... E é linda... Como é linda! Eu fiquei muda do outro lado da linha. Nunca tinha ouvido um garoto falar assim de uma garota. Fiquei imaginando como seria a mulher que beijaria o beijo de poeta. Ele queria casar com ela. Claro que nossa amizade se esvaziou com o tempo, e foi sumindo... Um tempo depois descobri que eles namoravam há um tempão e que eram feitos um para o outro. Ele ainda estava com o meu diário, e eu amava aquele diarinho. Certo dia eu liguei. Falei para ele deixar o meu diário na portaria, mas ele disse que queria entregar em mãos. A campainha tocou, eu abri a porta. Ele me deu o diário e me deu um beijo. Me perguntou: "ainda tenho beijo de poeta?" Eu fiquei muda. Assustada, sem saber o que fazer. Ele sorriu. Me abraçou e sumiu no horizonte. Nunca mais o vi. Soube que ele casou esse ano. Soube que ele é apaixonado. Nunca mais ouvi um homem falar de uma mulher daquela forma. E ele, sim. Ele ainda tinha beijo de poeta.

Um comentário:

Anônimo disse...

você tem beijo de poeta.

As suas coisas espalhadas

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