terça-feira, 26 de julho de 2016

Excel

Tenho vontade de tacar uma bomba nas suas planilhas de excel. Toda sua vida cabe em planilhas e você ainda tira sarro que eu não sei mexer nelas. Por favor, não vá, não me deixe. Será que você não vê que eu não vou saber viver sem as suas planilhas me organizando?

Roupas no chão

As suas roupas separadas em cima do sofá me fizeram chorar profundamente. Chorei por horas a fio enquanto pegava as camisas polo que você usa todos os dias e cheirava. Esse seu cheiro como ele é hoje, eu nunca mais vou sentir. A casa aos poucos vai ficando vazia das nossas coisas. Já tirei os meus livros e sapatos, você já tirou casacos e alguns quadros. Essa casa, esse seu cheiro, essa etapa da nossa vida, tudo isso está sendo deixado para trás. Uma despedida como essa para uma pessoa como eu, é de partir o coração em mil, esmigalhar, dar perda total. Acho engraçado o quanto nossas diferenças se destacam agora. Você encara isso tudo tão tranquilamente, com um pouco de ansiedade até, e eu só choro. Tenho tanto medo de sair dessa imensa zona de conforto que é minha vida agora. Tenho tanto medo de nunca mais encontrar um conforto como esse. Espero que você chegue tarde em casa hoje e não veja que eu espalhei todas suas roupas no chão, como se esse gesto infantil pudesse atrasar de alguma forma a nossa despedida.

terça-feira, 19 de julho de 2016

Beijo

Sinto falta de um beijo. Um beijo que começa no disparar do coração, na respiração ofegante e em outros sintomas do prazer. Esse beijo que ensaia muito antes de chegar, que passa lentamente pelos olhos, que examina a boca a ser beijada e se surge beijo devagar. Um beijo com um gosto, um gosto que não importa. Um gosto de língua, uma textura de língua, uma língua. Sinto falta de estudar os movimentos da língua que experimenta a minha. De sentir com as minhas mãos o rosto que carrega aquele beijo, sinto falta de um rosto. Um rosto num corpo que amassa o meu, e me beija como se um meteoro estivesse prestes a atingir a Terra. Um beijo de muito tempo, de dar êxtase seguido de uma calmaria alienante. Um beijo antigo como qualquer outro, desde que o primeiro homem vislumbrou os lábios da mulher amada e entendeu.

segunda-feira, 18 de julho de 2016

Madrugada

É madrugada em Budapest, e o homem que tem medo de altura dorme. Aquele homem, que veio do lado esquerdo da Meca, agora sonha. Com o que você sonha, homem-pássaro? Será com a mente humana, com os seus pecados, será com a morte? Sabe, beija-flor, você não precisa se preocupar tanto com o que pensam de você, são só três ou quatro pessoas que realmente sabem de você. Só elas podem te ajudar de alguma forma. O resto, todo o resto, só serve para te julgar, igual você julga o que lê no Guardian de manhã.

Três tempos

A peste do tempo 
saiu correndo
e em três segundos
levou você.

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Uma palavra

Certeza é uma palavra
que eu não posso falar,
porque para falar
a gente precisa possuir
cada letra
de cada palavra.
Eu não posso possuir
nada de certeza,
nem uma letra.
Certeza nenhuma
cabe na minha boca.

Talento

Será que é verdade que cada um de nós tem algum tipo de talento? Ou será que algumas pessoas não tem talento nenhum, apenas acham que tem? Como é que vou um dia saber se tenho talento ou não em alguma coisa? Como faço para saber que, entre as coisas que gosto de fazer, é naquela determinada que eu tenho talento? Se eu não tiver nenhum talento em nada, como faço para saber? E para me esconder? Como faço para não continuar fazendo o que eu gosto e enchendo o ouvido das pessoas de algo que eu não tenho talento? É possível viver uma vida inteira sem descobrir um talento?

quarta-feira, 13 de julho de 2016

Recado

Eu não sei o quanto se pode ser direto em uma poesia, e se por acaso não puder ser nem um pouco, vou falar baixinho, discreto, direto a você: devo te esperar? E se eu, sem querer, deixar a minha vida passar esperando? Acho que os perseguidores de pessoas diretas em poesias estão chegando, preciso ir, mas guarde o meu recado e pense, meu amor. Devo te esperar?

Adeus, agora

Meu bem, será que você não vê 
que o agora está acabando?
Indo embora, dizendo adeus?
Entrando no avião com todas as suas coisas e decolando?
Você não vê, meu bem, que você ficará aqui no chão,
acenando para a sombra de um avião 
que você viu passar?
"Adeus, agora!" você poderia gritar.  

terça-feira, 5 de julho de 2016

Enquanto

O que quero dizer, meu bem
é que enquanto eu estiver aqui,
não saberei dizer jamais
onde é que eu preferia estar.

sábado, 2 de julho de 2016

trecho

Ontem à noite, enquanto você dizia que não tinha certeza, que não via propósito, eu senti algo estranho dentro de mim. Senti um veludo lúgubre cobrir o meu coração. Precisava tanto chorar, mas no cuidado de tentar ser forte, não chorei. Minhas lágrimas estão aqui nesse trecho que escrevo enquanto você segue em frente fazendo as suas coisas.

Isso

Você me ligou hoje para dizer que fazia sol,
"vem aqui comigo!" - você disse.
Eu não fui.
Eu fiquei em casa, arrumando a cama,
fazendo os meus rituais.
O dia foi passando, hora por hora.
O sol lá do alto foi descendo,
descendo e indo embora.
Você também vai embora,
entenda.
Eu preciso aprender a me acostumar 
com isso. 

No fim

Quando eu chegar no fim da vida,
e estiver velhinha na minha cadeira,
fazendo tricô,
será que eu vou conseguir finalmente
entender a sua decisão?

Rasgos

A gente costumava rasgar os lençóis. Escondíamos os lençóis no meio da roupa pra lavar, constrangidos. Orgulhosos, nos olhávamos e ríamos um para o outro da nossa conquista.

As suas coisas espalhadas

Elas me observam andar pela casa, chorar escrever  quando é minha vez de observá-las choro um pouco mais por tudo que carregam viagens, lemb...